Datafolha: Para 43% dos brasileiros, Bolsonaro não protege a Amazônia

Apesar de retrocessos ambientais, 30% dos entrevistados ainda acredita que o presidente combate ilegalidades na região

A política antiambiental do presidente Jair Bolsonaro (PL) era clara desde o início de seu mandato em 2019. Incentivo à exploração de recursos naturais em áreas protegidas, desmonte de órgãos de fiscalização e congelamento de processos de demarcação de terra indígena são apenas alguns dos ingredientes que levaram a Amazônia a ter recordes de desmatamento e queimadas.

Apesar da piora em todos os indicadores ambientais, o governo tenta criar uma imagem positiva. Só relembrar o discurso de Bolsonaro na Assembleia Geral da ONU em 2020 sobre ter uma política de tolerância zero contra crimes ambientais ou as falas do ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite, na COP26 em 2021, defendendo o comprometimento do Brasil com a redução das emissões de CO2.

Depois de três anos e seis meses do mandato de Bolsonaro, a percepção do Brasil sobre as políticas ambientais do governo é ligeiramente negativa. Quatro em cada dez brasileiros (entre 39% e 43%) acreditam que Bolsonaro incentivou mais atividades ilegais na Amazônia do que as combateu, enquanto 3 em cada 10 brasileiros (entre 31% e 35%) dizem que o presidente combateu essas ilegalidades.

Os dados são da pesquisa do Datafolha publicada em 25 de junho, que entrevistou 2.556 pessoas no mesmo mês.

No questionário, os entrevistados responderam o que achavam da atuação de Bolsonaro no combate ou incentivo de quatro crimes, que incluiam desmatamento, o garimpo ilegal, a invasão de terras indígenas e a ação de caçadores e pescadores ilegais.

Segundo o Datafolha, 43% dos brasileiros acreditam que o presidente incentivou a ação de caçadores e pescadores ilegais na Amazônia, contra 31% que dizem que Bolsonaro combateu a prática.

Virou emblemático o caso do fiscal do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) que multou Bolsonaro em 2012 por pesca ilegal. Em 2018, a multa foi anulada. Um ano depois, o funcionário foi exonerado.

Em relação à invasão de terras indígenas, 39% veem um incentivo de Bolsonaro, enquanto 35% dos entrevistados acreditam que o mandatário combateu a prática.

Quanto ao garimpo ilegal, 40% dos brasileiros acreditam que o presidente mais incentiva do que combate essa prática, enquanto 33% acreditam que ele mais a combate do que a incentiva.

Um caso recente em que Bolsonaro tentou legalizar a mineração em áreas protegidas aconteceu em março deste ano, no auge da guerra entre Rússia e Ucrânia. O presidente utilizou a paralisação nas importações de potássio da Rússia como argumento para liberar a exploração do mineral em terras indígenas na Amazônia.

O desmatamento ilegal na Amazônia também é incentivado por Bolsonaro, de acordo com 43% dos brasileiros. Em contrapartida, 35% da população vê o empenho do presidente em combater o desmatamento ilegal.

Dados recentes do Sistema de Alerta de Desmatamento (SAD) do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) são um exemplo da política ambiental utilizada por Bolsonaro.

O relatório revelou que o desmatamento na Amazônia entre janeiro e maio de 2022 alcançou a maior área para o período em 15 anos — 3.360 km² de mata derrubada, o equivalente a mais de 2 mil campos de futebol.

Os números dos que acreditam no combate das práticas ilegais na Amazônia são maiores entre bolsonaristas. 63% dos seus apoiadores acredita que Bolsonaro combate a invasão às terras indígenas. Já em relação ao desmatamento, o número sobe para 65%.

Por que, mesmo com tantas evidências da política antiambiental do presidente, alguns brasileiros acreditam que Bolsonaro protege a Amazônia? Um estudo publicado no mês passado pode indicar respostas.

Divulgação científica contra dados falsos do meio ambiente

Pesquisadores dos Estados Unidos publicaram na revista Proceedings of the National Academy of Sciences um estudo que avaliou a eficiência da divulgação científica sobre o clima pela mídia.

“Se estudos têm mostrado repetidamente que a exposição a informações baseadas em fatos comprovados carrega credibilidade, por que o público continua desinformado sobre a crise climática?”, os autores questionam, na introdução do artigo.

Para responder à pergunta, os pesquisadores da Universidade George Washington, da Universidade Estadual de Ohio e da Universidade de Dartmouth ouviram 2.898 pessoas, que entraram em contato com conteúdos midiáticos e científicos sobre meio ambiente, com intervalos de uma semana entre a exposição de cada conteúdo.

O produto jornalístico de divulgação científica apresentado na primeira semana de pesquisa conseguiu sensibilizar a amostra em relação a propostas governamentais de proteção ambiental. Mas após a exposição a outros conteúdos nas semanas seguintes, incluindo informações falsas, uma parcela dos participantes deixou de acreditar na veracidade da crise climática.

Os autores do estudo constataram que essa mudança de opinião foi intensificada em pessoas que já estavam inclinadas a negar a ciência e em apoiadores do Partido Republicano (um dos dois maiores partidos dos Estados Unidos, de perfil conservador e do qual o ex-presidente Donald Trump é uma das figuras mais influentes).

“Nossos resultados indicam que a cobertura científica das mudanças climáticas aumenta a precisão da crença e o apoio à ação governamental imediatamente após a exposição, inclusive entre republicanos e pessoas que rejeitam a mudança climática antropogênica”, diz o estudo.

“Entretanto, ambos os efeitos se deterioram com o tempo e podem ser atenuados pela exposição a um conteúdo de opinião cético”, completam os autores.

Thomas Wood, professor associado de Ciências Políticas da Universidade Estadual de Ohio e co-autor do estudo, disse ao jornal britânico The Guardian que, para reforçar os impactos da divulgação científica, é necessário repetir a reprodução do conteúdo na mídia com mais frequência.

“Era impressionante para nós como os sujeitos de nosso estudo eram receptivos ao que eles liam [em relatórios cientificamente precisos] sobre as mudanças climáticas. Mas o que eles aprenderam desvaneceu-se muito rapidamente. O que encontramos sugere que as pessoas precisam ouvir as mesmas mensagens precisas sobre a mudança climática de novo e de novo. Se elas só a ouvem uma vez, isso desvanece muito rápido”.

No caso do Brasil, para intensificar o peso de informações comprovadas cientificamente, como o aumento do desmatamento na Amazônia durante o governo Bolsonaro e o papel do presidente na degradação da floresta, essas informações também precisam ser retransmitidas mais vezes pela mídia.

Imagem em destaque: Anderson Barbosa/Amazônia Latitude

 

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