Congressistas americanos debatem caminho mais eficiente para ajudar no combate ao desmatamento na Amazônia brasileira

Durante audiencia, deputados norte-americanos buscaram saída para crise ambiental no Brasil

Na última terça (10), parlamentares norte-americanos se reuniram em Washington Capital para discutir a melhor maneira de ajudar o governo brasileiro a preservar sua porção da floresta amazônica. Durante audiência pública da Comissão de Relações Exteriores da Câmara de Comércio, políticos e demais representantes da sociedade civil se mostraram preocupados com os destinos da preservação ambiental no Brasil sob a tutela de Jair Bolsonaro.

Um dos destaques da audiência foi a economista brasileira Monica de Bolle, que afirmou que as queimadas na Amazônia são uma faceta da “tragédia dos comuns”, situações onde pessoas jurídicas se apropriam de recursos de uso comunitário para seu próprio enriquecimento, às custas do bem público. Em seu testemunho, a economista afirmou que as sociedades “sabem como lidar com o problema: através de ação coletiva e regulação governamental”.

De Bolle também argumentou que “as queimadas na Amazônia não são apenas uma tragédia, mas uma oportunidade para os governos do Brasil e Estados Unidos pararem com a negação da mudança climática e cooperarem em estratégias para preservar a floresta amazônica e desenvolver formas sustentáveis de usar seus recursos naturais”. Como exemplo, ela cita a colaboração entre o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e a National Aeronautics and Space Administration (NASA), no desenvolvimento de tecnologias de monitoramento de desmatamento e queimadas na Amazônia brasileira.

Dentre as soluções propostas pela economista, está o incentivo governamental na criação de zonas seguras para a produção agropecuária na região amazônica, ao mesmo tempo em que aumenta a regulação, demarcação e consolidação dos direitos de propriedade nessas terras. Outro ponto levantado por Monica de Bolle é a necessidade de a comunidade internacional trabalhar com o Brasil para “reviver e expandir o Fundo Amazônia […] para levantar doações internacionais para investimento em atividades sustentáveis que protejam a floresta amazônica”.

William Millan, Diretor de Política Global na Fundação Internacional Caucus para Conservação (ICCF), abordou o tema de forma técnica em seu testemunho. Ex-diplomata americano, Millan possui vasta experiência com questões políticas na América do Sul, passando a trabalhar com conservação após deixar o cargo no governo.

William exaltou o fato de que a população amazônica aumentou de seis para 25 milhões de pessoas no período de 1960 a 2010, muitas das quais estão empregadas na agricultura – e mesmo com o crescimento expressivo da população, o Brasil conseguiu reduzir o desmatamento na Amazônia em 70% entre 2005 e 2015, diferente de seus vizinhos que compartilham a floresta. Com isso, Millan afirma que a queda no desmatamento se deve ao papel do Brasil em regular e fiscalizar sua porção da Amazônia na última década, mas que esse cenário se inverteu a partir de 2016. Outro fato levantado por ele durante o testemunho foi a aceleração do desmatamento detectada no meio de 2018 (época da campanha eleitoral para presidência da república) até junho de 2019, período no qual o desmatamento cresceu entre 40 e 80%.

Millan também chama a atenção para o direito de os habitantes explorarem economicamente os recursos naturais da região amazônica – ainda mais quando pobres. Para ele, a população de pequenos agricultores pouco escolarizada vive ansiosa pela possibilidade de “terras grátis” e melhores condições de trabalho, ao mesmo tempo em que grandes fazendeiros estão dispostos a contratá-los para trabalhar em terras ocupadas de forma irregular. O ambientalista também aponta para a situação dos povos indígenas, aos quais foram destinados apenas 15% do território amazônico, prevendo um agravamento em sua situação caso as leis e a fiscalização continuem sendo enfraquecidas.

“A situação na Amazônia brasileira, assim como nos países vizinhos da bacia amazônica, é complexa e envolve o balanceamento de diversos interesses que competem entre si, muitos dos quais são legítimos. É improvável que (a situação) seja resolvida puramente por pressão externa. Uma mistura de política, economia e persuasão moral serão necessárias ao longo de anos por vir. O progresso será desigual e algumas vezes reverso. Mas precisamos tentar e continuar tentando. Nisso, a assistência externa dos Estados Unidos desempenham um papel importante”, declarou Millan durante seu testemunho.

Ao final de seu argumento, o Diretor e Política Global do ICCF falou a respeito da necessidade no aumento de 100% na produção agrícola mundial até meados de 2050, preocupação atrelada ao crescimento demográfico. Para exemplificar a situação, Millan cita um estudo da ONG The Nature Conservancy. Segundo ele, recorrer à expansão da já extensa área de cultivo para suprir a futura demanda por alimentos pode acabar com o mundo natural.

“Apenas através do aumento da produção das terras existentes, usando métodos que conciliam alta produtividade e sustentabilidade, poderemos suprir futuras necessidades sem causar destruição. Isso significa que a Amazônia não é necessária para o futuro da agricultura. A floresta existente é necessária para um rol de outros benefícios. Insistimos que o congresso apoie esse objetivo”, conclui William Millan.

Daniel Nepstad, Presidente e Diretor Executivo do Earth Innovation Institute, falou da importância da Amazônia por sua absorção de CO2 da atmosfera, e tratou de desmitificar o boato de que a maior parte do oxigênio disponível no mundo é produzido pela floresta.

Nepstad, que não deixou de abordar pontos como biodiversidade, povos indígenas, e as taxas de desmatamento na Amazônia na última década, foi enfático ao exaltar o trabalho de conservação feito pelo Brasil ao longo dos anos. Ele afirma que o aumento gradativo do desmatamento na Amazônia desde 2012 deve-se em parte à falta de recompensa estatal para os produtores que respeitam o rigoroso código ambiental brasileiro, mantendo 80% da vegetação nativa em suas propriedades. 

“Em termos de finanças, apenas 3% das emissões de 7 toneladas de dióxido de carbono que foram evitadas por esse esforço hercúleo foram compensadas pela Noruega e Alemanha (através do Fundo Amazônia), com pagamentos baseados no desempenho dos produtores”,  declarou Nepstad, que defende que a falta de reconhecimento e valorização do mercado complacente com legislação ambiental é um dos fatores responsáveis pelo enfraquecimento dessas leis, o que tende a agravar ainda mais o desmatamento.

Daniel Nepstad finaliza argumentando que Brasil e Estados Unidos devem seguir dialogando em direção a um acordo de troca bilateral, recompensando fazendeiros e Estados amazônicos complacentes com as leis ambientais com acesso a mercados estratégicos, contanto que apresentem resultados positivos a respeito da conservação. No testemunho, Nepstad declarou que “Novas parcerias público-privado, promovidas através da Aliança para o Desenvolvimento Global da USAID, podem enviar um sinal positivo para os Estados amazônicos.

Deputado Albio Sires faz observações durante audiência do subcomitê sobre o fogo na Amazônia brasileira

Deputado Albio Sires. Foto: Divulgação.

O deputado americano Albio Sires, Presidente do Comitê da Câmara para Assuntos Estrangeiros no Hemisfério Ocidental, Segurança Civil e Comércio dos EUA, fez as seguintes observações durante a audiência do subcomitê sobre o fogo na Amazônia brasileira:

“Convoquei essa audiência porque proteger a Amazônia é vital para a saúde do nosso planeta. A região amazônica é a mais biodiversa no mundo. Ela também contém aproximadamente um quinto do suprimento global de água potável. A água liberada pelas plantas e pelos rios da Amazônia impacta as tendências climáticas ao longo da América do Sul e pode afetar a precipitação e a severidade das secas. A Amazônia também armazena bilhões de toneladas de dióxido de carbono, sendo que uma porção do mesmo entra na atmosfera com a ocorrência de desflorestamento, acelerando a mudança do clima no mundo.”

“Por essas e outras razões, o incêndio em curso na floresta amazônica é um problema que diz respeito a todos nós. Embora o fogo tenha ajudado a chamar atenção para o que acontece na Amazônia, sabemos que ele representa apenas um sintoma de um problema muito maior – o desmatamento. Geralmente, os cientistas concordam que a Amazônia pode chegar a um ponto de inflexão se as taxas de desmatamento persistirem. Esse cenário comprometeria os diversos benefícios que a Amazônia assegura ao nosso clima, assim como ameaçaria as milhões de espécies de plantas e animais encontrados no ecossistema da floresta amazônica.”

“O objetivo dessa audiência é entender a causa e o escopo do problema e explorar soluções para preservar a Amazônia. Hoje, ouviremos análises de especialistas em políticas de proteção ambiental no Brasil, desafios para sua implementação e recomendações sobre o que mais precisa ser feito.”

“Eu valorizo profundamente nossa relação com o Brasil e aprecio o comprometimento histórico do governo brasileiro em equilibrar a promoção do desenvolvimento econômico com os esforços para preservar o meio ambiente. Na procura por um caminho para o sucesso, não precisamos olhar mais à frente do que o Brasil. De 2005 a 2014, o desmatamento na Amazônia brasileira caiu 70%. Durante o mesmo período, a economia brasileira cresceu e cerca de 30 milhões de pessoas foram tiradas da pobreza.”

“Em outras palavras, no passado os esforços de desenvolvimento econômico bem regulados andaram de mãos dadas com programas de proteção ambiental de sucesso. Não existe razão para que isso não possa ser novamente alcançado.”

“Acredito que os Estados Unidos tenham um papel a cumprir no suporte ao Brasil quanto a essa questão, e eu insisto que meus colegas de ambos os lados trabalhem juntos para cumprir nosso papel de liderança global. Nós também precisamos apoiar as comunidades indígenas que vivem na Amazônia, as quais dependem da saúde da floresta para exercer seu direito de viver em suas terras ancestrais. Preservar a Amazônia não é apenas a coisa certa a se fazer. Essa é uma questão que afeta diretamente nossos próprios interesses, pois a integridade da floresta amazônica afeta a qualidade da água que bebemos e o ar que respiramos.”

“Infelizmente, os Estados Unidos não podem ser líderes ambientais se não retornarmos a uma política de reconhecimento científico da realidade das mudanças climáticas. Eu critiquei com afinco a decisão do governo Trump em retirar os Estados Unidos do Acordo de Paris, não apenas porque ignora as esmagadoras evidências científicas, mas também porque essa decisão minou nossa credibilidade no palco global e feriu nosso interesse de segurança nacional.”

“Isso não deveria ser uma questão partidária. Se não levarmos a ameaça da mudança climática a sério, nossos filhos e netos nunca nos perdoarão por falhar no cumprimento das demandas morais de nosso tempo. Hoje, eu espero por uma discussão bipartidária sobre como o Congresso dos Estados Unidos pode elaborar as políticas necessárias para combater as mudanças no clima e trabalhar com o governo brasileiro para proteger a Amazônia”.

 

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