Resenha: Uma cientista na copa das árvores

Paisagem de uma passarela em copas de árvores em preto e branco. Do lado direito, a capa do livro The Arbonaut.
Em “The Arbornaut”, a bióloga de campo Meg Lowman conta suas pesquisas pioneiras nas copas das florestas do mundo.

Capa do livro The Arbonaut

The Arbornaut: A Life Discovering the Eighth Continent in the Trees Above Us
Autora: Meg Lowman
Editora: Allen & Unwin
Ano: 2021

Quando se considera que “metade de todas as criaturas terrestres vive quase a 30 metros ou mais acima de nossas cabeças”, como observa a bióloga Meg Lowman em “The Arbornaut: A Life Discovering the Eighth Continent in the Trees Above Us“, faz sentido que os cientistas olhem para cima. Mas foi só nas últimas décadas que pesquisadores começaram a explorar sistematicamente copa de árvores em florestas tropicais e temperadas do mundo — e, em grande parte, devido aos esforços dos chamados arbornautas como Lowman.

É um trabalho assustador e, muitas vezes, perigoso. Enquanto no passado, houve quem usasse cordas e equipamentos de escalada para conduzir pesquisas científicas, Lowman em 1979 foi pioneira em um método simples de preparar árvores para escalada usando um estilingue. Em resumo: ela lançava do chão uma linha de pesca pesada nos galhos superiores da árvore, depois prendia essa linha um cordão de nylon e a arrastava na mesma direção. Ela, então, amarrava uma corda de escalada mais pesada ao cordão de nylon e a puxava para cima e sobre o galho de apoio.

Lowman e uma colega australiana também fizeram um trabalho pioneiro construindo passarelas de dossel (arvorismo). Durante uma viagem de campo com a Earthwatch, uma organização que conecta cientistas cidadãos com pesquisadores do mundo inteiro, uma das voluntárias ficou com o cabelo preso na corda de escalada. Ela precisou cortar o cabelo sem danificar a corda para se libertar — uma situação difícil, especialmente para uma voluntária. Lowman e o proprietário do alojamento onde estavam discutiram como trazer escaladores em segurança para o dossel por meio de um caminho aéreo. O que também seria benéfico para pesquisas, já que muitos pesquisadores poderiam trabalhar no dossel ao mesmo tempo. No ano seguinte, o primeiro dossel do mundo foi construído no Parque Nacional Lamington, em Queensland, Austrália. Lowman teve acesso ao dossel utilizando guindastes de construção e uma balsa inflável acoplada a um dirigível.

O livro traça sua carreira científica. Desde seu estudo de plantas e ovos de aves quando era criança no norte de Nova Iorque até seus anos de graduação estudando o crescimento de árvores. De sua pesquisa de mestrado estudando fenologia de árvores (folhagem de primavera), ao doutorado, onde encontrou sua especialidade: os efeitos de insetos comedores de folhas de árvores tropicais. O campo era pouco estudado porque a maioria dos pesquisadores não tinha acesso à copa das árvores para medi-las — e foi esse acesso que Lowman desenvolveu.

No livro, ela diz repetidamente que algumas pesquisas são enviesadas porque certas descobertas científicas se baseiam em estudos feitos apenas no chão da floresta ou nas partes inferiores das árvores, excluindo a copa. Ela compara a situação como diagnosticar uma doença olhando apenas para o dedão do pé.

Meg Lowman em uma passarela sob copas de árvocres

Meg Lowman, conhecida como “Canopy Meg”, caminha entre árvores no Peru. Foto: Arquivo pessoal/ Meg Lowman

Um dos temas recorrentes de Lowman é a importância do processo científico, que ela expressa com perguntas interativas. De fato, a seção mais longa do livro descreve sua pesquisa de doutorado e os estudos adicionais que ela fez para descartar vieses em seu estudo principal. O leitor é bombardeado com experimentos que Lowman realizou para responder perguntas menores que surgiram durante sua pesquisa, como se os insetos são atraídos para comer tinta resistente à água que ela usa para rotular as folhas; se eles podem encontrar o caminho de volta à sua fonte de alimento se caírem da copa das árvores; e se as folhas jovens ou velhas são mais tóxicas para os insetos.

Lowman também discute a luta das mulheres na ciência, escrevendo que “durante meus 11 anos na Austrália, sofri mais assédios sexuais de colegas homens durante trabalhos de campo do que se pode contar nos dedos”. Ela se casou com um rancheiro australiano durante sua pesquisa de pós-doutorado e se lembra de lidar com a atitude sexista da Austrália rural em relação a mulheres com profissões como a dela.

Ela escreve sobre pesquisar copas de árvores usando um balde de colher cerejas enquanto estava grávida e como ela escondeu suas revistas científicas dentro de exemplares da revista Woman’s Weekly para que sua sogra não encontrasse falhas em suas tarefas domésticas. Ela se candidatou a uma vaga em uma universidade australiana, mas não conseguiu o emprego porque o comitê de contratação acreditava que “a esposa de um fazendeiro, e especialmente uma jovem mãe, não poderia assumir uma vaga de professora”. Mas, quando recebeu o convite para ser professora visitante na Williams College nos EUA, ela o aceitou, terminando seu casamento e começando uma longa carreira como mãe solteira e cientista.

Depois que deixou Williams College por causa de uma mudança na administração, Lowman passou por uma série de cargos em museus americanos e se demitiu de cada um deles depois de ter sido maltratado por seus superiores imediatos (homens) por ser uma mulher na ciência. Lowman escreve: “Minhas colegas mulheres e eu até podemos ter sido pioneiras em biologia de campo, mas nos machucamos tanto em barreiras invisíveis toda vez que chegamos além do esperado; antecipei — e pior ainda — tolerei os machucados”. Este capítulo, embora breve, destaca os problemas que as mulheres enfrentam na ciência e mostra que, na ausência de mentoras femininas, as mulheres no topo da carreira têm pouco apoio para se manter lá.

Canopy Meg, como Lowman é conhecida, é agora uma “escritora-exploradora autônoma” que dirige duas organizações: a Fundação TREE, uma organização sem fins lucrativos que promove a pesquisa e educação florestal, e a Mission Green, que promove a construção de passarelas e o ecoturismo para preservar a biodiversidade. Lowman se vê como uma construtora de pontes em mais do que o sentido literal. “Parte da alegria da descoberta científica é compartilhá-la com outros”, escreve.

Agora, com quase 70 anos, ela tem sido fundamental para levar cientistas que usam cadeiras de rodas para dentro do dossel por meio de suas técnicas de corda. Durante 25 anos, ela fez viagens anuais à Amazônia peruana levando cientistas cidadãos que querem aprender sobre o dossel da floresta tropical. Seu trabalho a levou para a Malásia, onde ela organizou um “BioBlitz” para ajudar os voluntários a identificar todas as espécies que poderiam encontrar na floresta em 10 dias. Também trabalhou com pesquisadores e padres locais na Etiópia para proteger florestas remanescentes que cercam suas igrejas. E na Índia, ela trabalhou com cientistas locais para treinar arbornautas e aprimorar os estudos de copa das árvores ao sediar uma conferência internacional.

Estruturada mais ou menos cronologicamente, a linha do tempo do livro é, no entanto, um pouco confusa em alguns lugares. Embora Lowman escreva na primeira pessoa, é uma prosa expositiva, cheia de minúcias sobre a vida na árvore e seus métodos de pesquisa, mas com praticamente nenhum diálogo para animar as coisas. Ela acaba contando, não mostrando, aos leitores sua história de vida, e enquanto sua escrita é geralmente acessível, o uso frequente de nomes em latim com descrições científicas detalhadas pode ser uma distração para um público não-especialista.

No entanto, Lowman teve uma jornada fascinante. Embora possa ter sido uma arbonauta solitária quando começou a subir no dossel da floresta, agora ela é uma das centenas no mundo inteiro. “Como uma arbornauta”, escreve, “eu grito incessantemente sobre a importância das árvores e como elas mantêm o planeta saudável, assim como toda a humanidade“.

Sarah Boon é uma escritora baseada na Ilha de Vancouver, cuja obra apareceu em The Rumpus, Longreads, The Millions, Hakai Magazine, Literary Hub, Science, and Nature. Atualmente, ela está escrevendo um livro sobre suas aventuras de pesquisa de campo em locais remotos.
Este artigo foi publicado originalmente em Undark. Leia aqui: Resenha original.
Tradução: Matheus Ferreira

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