Savanização da Amazônia brasileira ameaça mamíferos até em áreas protegidas

Jaguatirica está entre os mamíferos que habitam a Amazônia e outros biomas, e que será afetada pela savanização. Foto: Anna Cotta
  • O desmatamento e as mudanças climáticas globais estão levando à savanização da Amazônia
  • Estudo revela que este processo afeta negativamente mamíferos terrestres, ainda que estejam adaptados a outros biomas, como o Cerrado
  • O impacto atinge também animais em áreas de preservação

De onças e jaguatiricas a tamanduás e capivaras, a maioria dos mamíferos terrestres que vivem na Amazônia brasileira está ameaçada pelas mudanças climáticas e pela savanização em curso da região. É o que diz um estudo publicado na revista “Animal Conservation”, da Universidade da Califórnia em Davis (UC Davis), EUA.

A pesquisa constatou que mesmo os animais que habitam tanto floresta quanto savana, como onças e tatus gigantes, são vulneráveis a essas mudanças. Também ilustra como espécies e terras protegidas por meio de esforços locais não estão imunes às mudanças climáticas globais.

“Estamos perdendo a floresta amazônica enquanto falamos”, disse Daniel Rocha, que conduziu a pesquisa como aluno de doutorado no Departamento de Vida Selvagem, Peixes e Biologia da Conservação da UC Davis.

A biodiversidade da Amazônia é muito suscetível aos efeitos das mudanças climáticas. Não é apenas local; é um fenômeno global. Não podemos impedir isso apenas pela aplicação da lei, por exemplo. Essas espécies são mais suscetíveis do que imaginávamos, e mesmo as áreas de preservação não podem protegê-las tanto quanto pensávamos.
Daniel Rocha, coordenador do estudo

O que é “savanização?”

A savana intocada é um bioma único que suporta uma gama diversificada de vida. Porém, “savanização” é o processo no qual a exuberante floresta tropical dá lugar a uma paisagem mais seca e aberta que se assemelha à savana –mas que na verdade é uma floresta degradada.

O desmatamento local e as mudanças climáticas globais na temperatura e na quantidade de chuva favorecem essa conversão ao longo das bordas sul e leste da Amazônia brasileira.

Espécies arbóreas como macacos serão claramente afetadas por tais mudanças. Mas os autores do estudo queriam entender melhor como se espera que os mamíferos terrestres se saiam –especialmente aqueles que usam habitats de floresta e savana quando têm acesso a ambos.

Pesquisadores usaram armadilhas fotográficas

Para o estudo, os pesquisadores realizaram pesquisas com armadilhas fotográficas para mamíferos terrestres em quatro áreas protegidas do sul da Amazônia brasileira, que é uma mistura de floresta tropical e Cerrado natural (savana).

Usando modelos estatísticos, eles quantificaram como 31 espécies foram afetadas pelo habitat de savana. Eles então procuraram diferenças entre as espécies conhecidas por usar principalmente floresta tropical, savana ou ambos os habitats.

Os resultados mostraram que apenas algumas espécies preferem o habitat de savana. Rocha observa que os modelos foram baseados em savana intocada (não degradada), de modo que os efeitos negativos da savanização entre os animais provavelmente serão ainda mais fortes.

As matas ciliares, que circundam as margens úmidas de rios e córregos, ajudaram a aliviar os efeitos da savanização até certo ponto.

Mesmo espécies “generalistas” saem perdendo

“Infelizmente, há mais perdedores do que vencedores”, disse Rocha, que atualmente é professor assistente na Southern Nazarene University, em Oklahoma, EUA.

A maioria das espécies amazônicas, quando podem escolher entre boas florestas e boas savanas, escolhem a floresta. Isso é verdade mesmo para espécies consideradas ‘generalistas’, que usam ambos os habitats. À medida que perdemos florestas, eles também sofrem.
Daniel Rocha

Os resultados indicam que, se a savanização causada pelo clima fizer com que as espécies percam o acesso ao habitat preferido, isso reduzirá a capacidade até mesmo das áreas protegidas de preservar a vida selvagem. Os autores dizem que isso deve ser considerado ao avaliar os possíveis efeitos das mudanças climáticas nessas espécies.

O estudo foi conduzido em coautoria com Rahel Sollmann, ex-conselheiro de Rocha na UC Davis, que agora está no Instituto Leibniz de Pesquisa em Zoológico e Vida Selvagem em Berlim, Alemanha.

A pesquisa foi financiada pela Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), National Geographic Society, Horodas Family Foundation for Conservation Research, The Explorers Club, Alongside Wildlife Foundation e Hellman Foundation. O estudo ainda recebeu apoio logístico do ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade).

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