Fotogaleria: Dois Bois e Mil Encantarias – a Revolução Cultural de Parintins

Edmar Barros registra o 58º Festival de Parintins, que aconteceu no coração da Floresta Amazônica, nos dias 27, 28 e 29 de junho

Indígena do Povo Kokama, chega na cidade de Parintins (AM), para vender artesanatos. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.
Indígena do Povo Kokama, chega na cidade de Parintins (AM), para vender artesanatos. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.
Indígena do Povo Kokama, chega na cidade de Parintins (AM), para vender artesanatos. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Indígena do Povo Kokama, chega na cidade de Parintins (AM), para vender artesanatos. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Dois bois de pano centenários, Caprichoso (representado pelas cores azul e preto) e Garantido (vermelho e branco), ganham vida para protagonizar o maior festival folclórico a céu aberto do mundo. Todo ano, durante três dias, no último fim de semana de junho, a realidade é suspensa para dar lugar a uma celebração que exalta os saberes, a cultura e a potência dos povos originários e tradicionais da região.

Em Parintins, a 369 km de Manaus, tudo gira em torno do Festival. A cidade se divide entre os redutos das duas torcidas. O azul e o vermelho tomam conta das praças, casas, muros e ruas. Até as marcas patrocinadoras adaptam sua identidade visual e a Ilha se transforma em uma enciclopédia visual viva da Amazônia.

Na última segunda-feira (30), o Garantido, com o tema “Boi do Povo, Boi do Povão”, conquistou seu 33º título no Festival. A diferença de 1,1 ponto rompeu com a sequência de três vitórias do adversário, cujo tema foi “É tempo de retomada”, e a decisão foi contestada pelo Caprichoso, que se autodeclarou “Campeão do povo”.

O que começou como uma brincadeira de quintal entre pescadores, agricultores e outros trabalhadores se transformou em uma das principais manifestações de cultura popular do planeta: o Boi-Bumbá de Parintins, um espetáculo grandioso que encanta qualquer pessoa que tenha a chance de assisti-lo.

É a criatividade dos povos amazônidas expressa em música, dança, figurinos, alegorias e narrativas que evocam as cosmologias originárias.

Entre os itens obrigatórios apresentados na arena, estão personagens emblemáticos que representam figuras da cultura e espiritualidade da Amazônia. O Pajé é o curandeiro, líder espiritual e guardião dos saberes ancestrais, responsável por momentos de cura e encantamento durante a apresentação. A Cunhã-poranga é a mulher mais bela da aldeia, símbolo de força, beleza e resistência feminina indígena. Há ainda os Povos Indígenas, os rituais e as lendas, que compõem um mosaico visual e simbólico da floresta e de quem a habita. Com papel central na disputa, esses itens são avaliados por um corpo de jurados.

O Festival de Parintins se estrutura como um grande espetáculo dramatúrgico inspirado no auto do boi, uma narrativa popular presente em várias regiões do Brasil, que conta a história do boi que morre e ressuscita. Na Ilha, essa narrativa ganha nova dimensão ao ser reinterpretada com elementos das cosmologias indígenas, afro-amazônicas e ribeirinhas. O boi não é apenas um personagem folclórico, é símbolo de fertilidade, força vital e vínculo com a terra, tornando o evento uma celebração da vida em meio à luta por existência.

O evento é a continuidade de uma tradição milenar dos ancestrais da Amazônia, para quem a arte é um meio de conexão com o território e os espíritos da natureza.

Os universos simbólicos ganham vida com os movimentos surpreendentes das alegorias. Foi, justamente, a genialidade dos artistas parintinenses que, décadas atrás, revolucionou o carnaval do Sudeste brasileiro, introduzindo o movimento nas alegorias das escolas de samba do Rio de Janeiro e São Paulo.

Milhares de profissionais tornam esse espetáculo possível a cada edição. E se superam. É um verdadeiro ecossistema criativo e econômico, mobilizando artesãs, costureiras, figurinistas, dançarinas, pesquisadores, músicos, escultores, coreógrafos e mestres da cultura popular. Todos trabalham o ano inteiro para dar vida ao Boi-Bumbá.

Ao longo desse período, uma intensa programação movimenta os dois bois e suas torcidas, reafirmando a transmissão contínua de saberes manuais, orais e estéticos, de geração em geração.

As toadas falam de seres mitológicos das cosmologias indígenas, paixões pelos bois, rituais de cura, encantarias, crenças ribeirinhas e espiritualidade dos povos da floresta. Elas se tornam cantos da memória coletiva. A rivalidade dá o tom da festa.

O Boi Garantido nasceu em 1913, fruto de uma promessa feita por Lindolfo Monteverde a São João, em busca de cura para uma enfermidade. No mesmo ano, o Boi Caprichoso surgiu pelas mãos de famílias nordestinas, como os Cid e os Gonzaga, que migraram para a Amazônia durante o primeiro ciclo da borracha, no final do Século XIX.

Essa dualidade é como o encontro das águas, o fenômeno natural em que os rios Negro e Solimões correm lado a lado, sem se misturar, até formarem juntos o maior rio do mundo, o Amazonas.

O Garantido tem como característica principal manter o chão da tradição da brincadeira de Boi-Bumbá, enquanto o Caprichoso está mais na vanguarda, propondo inovação. São forças opostas que, em harmonia, celebram a herança ancestral da cultura popular amazônica.

O Bumbódromo, com capacidade para cerca de 25 mil pessoas, torna-se o palco de uma grandiosa exaltação da floresta e dos povos que a habitam. Um espaço de resistência.

Esse protagonismo é uma das principais pautas das populações amazônicas para a COP30, que acontecerá em novembro, em Belém. O Festival torna visível o que o mundo precisa reconhecer: a Amazônia é um território vivo, habitado por povos que carregam saberes ancestrais e soluções para as crises climáticas que se agravam em todo o planeta.

Na Conferência, espera-se que esses povos sejam escutados não como símbolos, mas como autoridades legítimas, em decisões que envolvem o destino da floresta e da humanidade.

O Festival permite vislumbrar um universo de realismo mágico, onde tudo é possível. Na utopia cabocla, onde os sonhos tomam formas, sons e cores, a floresta é respeitada, os povos originários e tradicionais são ouvidos, e o mundo reencontra a harmonia entre humanidade e natureza. Porque são todos uma coisa só. Mas isso não precisa, e não deve, permanecer no campo da utopia.

Confira o registro do fotojornalista e colaborador da Amazônia Latitude, Edmar Barros, que acompanhou os três dias da 58ª edição do maior espetáculo a céu aberto do mundo. Como já é de costume, ele nos convida a celebrar, por meio de suas imagens, a riqueza dessa tradição cultural da Amazônia.

Barcos com turistas de todo o país chegam a Parintins. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Barcos com turistas de todo o país chegam a Parintins. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Segundo o Governo do Amazonas, o município recebeu mais de 120 mil visitantes. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Segundo o Governo do Amazonas, o município recebeu mais de 120 mil visitantes. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Neste período, os visitantes movimentaram mais de R$ 180 milhões na economia local, segundo o Governo do Amazonas. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Neste período, os visitantes movimentaram mais de R$ 180 milhões na economia local, segundo o Governo do Amazonas. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Turistas desembarcam de barcos regionais, um dia antes do início do 58º Festival Folclórico em Parintins. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Turistas desembarcam um dia antes do início do Festival. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Vista do Bumbódromo, onde será apresentado o 58º Festival Folclórico de Parintins. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Vista do Bumbódromo, onde será apresentado o 58º Festival Folclórico de Parintins. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Alegoria do Boi Garantido, no Bumbódromo, durante apresentação, na primeira noite do 58º Festival Folclórico de Parintins. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Alegoria do Boi Garantido, no Bumbódromo, durante apresentação, na primeira noite do 58º Festival Folclórico de Parintins. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Porta-Estandarte, do Boi Garantido, Jeveny Mendonça, no Bumbódromo, durante apresentação. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Porta-Estandarte, do Boi Garantido, Jeveny Mendonça, no Bumbódromo, durante apresentação. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Vendedor ambulante trabalha ao lado de muro de cemitério pintado com figuras típicas regionais. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Vendedor ambulante trabalha ao lado de muro de cemitério pintado com figuras típicas regionais. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

A Cunhã Poranga do Boi Garantido, Isabelle Nogueira. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

A Cunhã Poranga do Boi Garantido, Isabelle Nogueira. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Tuxauas do Boi Garantido se apresentam no Bumbódromo. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Tuxauas do Boi Garantido se apresentam no Bumbódromo. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Torcedores do Boi Caprichoso, caminham ao lado de muro pintado com figuras típicas regionais. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Torcedores do Boi Caprichoso, caminham ao lado de muro pintado com figuras típicas regionais. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Detalhe da alegoria da Lenda Amazônica, "Yurupari o Legislador" apresentada pelo Boi Caprichoso. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Detalhe da alegoria da Lenda Amazônica, “Yurupari o Legislador” apresentada pelo Boi Caprichoso. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Boi Caprichoso, na arquibancada da galera, no Bumbódromo. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Boi Caprichoso, na arquibancada da galera. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Movimentação de turistas, em frente a Cadetral Nossa Senhora do Carmo. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Movimentação de turistas, em frente a Cadetral Nossa Senhora do Carmo. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Figura Típica Regional "Majés, as senhoras da cura". Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Figura Típica Regional “Majés, as senhoras da cura”. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Boi Caprichoso durante a primeira noite do 58º Festival Folclórico de Parintins. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Boi Caprichoso durante a primeira noite do 58º Festival Folclórico de Parintins. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Manifestante exibe faixa em defesa da Amazônia, em frente a Cadetral Nossa Senhora do Carmo, durante o primeiro dia do 58º Festival Folclórico de Parintins. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Manifestante exibe faixa em defesa da Amazônia, em frente a Cadetral Nossa Senhora do Carmo, durante o primeiro dia do 58º Festival Folclórico de Parintins. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Sinhazinha da fazenda, Valentina Coimbra, com o Boi Garantido. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Sinhazinha da fazenda, Valentina Coimbra, com o Boi Garantido. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Ângela Mendes, filha de Chico Mendes, e outros ativistas, exibem faixa de proteção à Amazônia. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Ângela Mendes, filha de Chico Mendes, e outros ativistas, exibem faixa de proteção à Amazônia. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

A Cunhã Poranga do Boi Garantido, Isabelle Nogueira, se apresenta com Indígenas de diversos povos. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

A Cunhã Poranga do Boi Garantido, Isabelle Nogueira, se apresenta com Indígenas de diversos povos. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Porta-Estandarte do Boi Caprichoso, Marcela Marialva, exibe o rosto de Chico Mendes. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Porta-Estandarte do Boi Caprichoso, Marcela Marialva, exibe o rosto de Chico Mendes. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Ritual Indígena de cura Yawanawá, apresentado pelo Boi Caprichoso. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Ritual Indígena de cura Yawanawá, apresentado pelo Boi Caprichoso. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Movimentação de turistas e moradores, durante o 58º Festival Folclórico de Parintins. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Movimentação de turistas e moradores, durante o 58º Festival Folclórico de Parintins. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Boi Garantido, na arena do Bumbódromo, durante apresentação, na terceira noite do 58º Festival Folclórico de Parintins. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Boi Garantido, na arena do Bumbódromo, durante apresentação, na terceira noite do 58º Festival Folclórico de Parintins. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Figura típica regional "Artesãs Indígenas", é apresentada pelo Boi Garantido durante a terceira noite do Festival. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Figura típica regional “Artesãs Indígenas”, é apresentada pelo Boi Garantido durante a terceira noite do Festival. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Uma mãe, vendedora ambulante, organiza camisas para venda, enquanto seu filho aguarda em um carrinho de bebê, no início da segunda noite do 58º Festival Folclórico de Parintins. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Uma mãe, vendedora ambulante, organiza camisas para venda, enquanto seu filho aguarda em um carrinho de bebê, no início da segunda noite do 58º Festival Folclórico de Parintins. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Porta-Estandarte do Boi Garantido, Jeveny Mendonça. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Porta-Estandarte do Boi Garantido, Jeveny Mendonça. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Porta-Estandarte do Boi Caprichoso, Marcela Marialva. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Porta-Estandarte do Boi Caprichoso, Marcela Marialva. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Movimentação em frente ao Bumbódromo. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Movimentação em frente ao Bumbódromo. Foto: Edmar Barros / Amazônia Latitude.

Fotos: Edmar Barros
Texto: João Felipe Serrão
Montagem da Página: Alice Palmeira
Revisão: Juliana Carvalho
Direção: Marcos Colón

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