Edição impressa: impactos e conflitos de um megaprojeto de celulose no Maranhão

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[DESTAQUE] Este texto é um destaque do artigo “Conflitos socioambientais decorrentes da ação da empresa de papel e celulose em Imperatriz, Maranhão”, publicado na edição impressa da Amazônia Latitude. Com depoimentos e uma análise detalhada de empreendimentos, autor demonstra os efeitos econômicos e ambientais da instalação e operação de uma fábrica de celulose numa cidade maranhense.

Quais são os impactos em uma cidade a partir da construção de um megaprojeto de celulose? Quais são as consequências para o ambiente e para a população no local? Essa é a reflexão do artigo “Conflitos socioambientais decorrentes da ação da empresa de papel e celulose em Imperatriz, Maranhão”, de Felipe Cunha.

O autor utiliza o conceito de conflito socioambiental, elaborado por Henri Ascelrad, para verificar a interferência do projeto nos modos de vida tradicionais. Observa três projetos de diferentes tempos: Projeto Celulose do Maranhão (CELMAR), de 1992, Ferro Gusa Carajás, em 2003, e Suzano Papel e Celulose, de 2011, foco da análise.

Os empreendimentos, diz o autor, são “afluentes” do Programa Grande Carajás, complexo de mineração de 900 mil km² iniciado nos anos 1970 e 1980 que se estende por terras de Pará, Tocantins e Maranhão. Os locais abordados no estudo são comunidades de Imperatriz, no Maranhão: Projeto de Assentamento (P. A.) Vila Conceição I e nas comunidades Esperantina I e II, Nova Bacaba e São José da Matança, também localizadas nas proximidades da chamada “estrada do arroz” (MA-123).

Um exemplo de reflexo é o aumento dos conflitos pela posse da terra, que já existiam antes e foram acentuados a partir da aquisição de pequenas e grandes propriedades para o plantio de eucalipto.

“Eles só compravam se tivesse documento legal; se tivesse conflito não compravam. Eles tinham esse critério, né, mas foram comprando, comprando… e aumentou a valorização do alqueire da terra aqui. Antes, as terras eram desvalorizadas. Passaram a ser valorizadas com essa especulação da CELMAR comprando terra”, disse à pesquisa Valdinar Barros, à época com 57 anos, morador do P. A. Itacira I, em Vila Conceição I.

Latifúndios e resistência

Açailândia, a 68 km de Imperatriz, viu surgir nos anos 1980 a semente da monocultura do eucalipto numa fazenda da então Companhia Vale do Rio Doce. Doze anos mais tarde, a empresa se juntou a duas outras num consórcio para fundar o projeto CELMAR, em Imperatriz. As três passaram a adquirir grandes quantidades de terra para a execução do projeto, como contou Valdinar à pesquisa.

A população local e diversos movimentos, como a Comissão Pastoral da Terra, o MST e organizações de quebradeiras de coco babaçu, confrontaram a implantação e o desenvolvimento do projeto, implantado de forma inacabada.

Mais de uma década depois, em 2003, a Vale criou o Ferra Gusa Carajás e manteve a expansão das plantações de eucalipto. A planta seria utilizada como carvão vegetal para as siderúrgicas de ferro gusa em Açailândia. Com a queima até do coco babaçu, os conflitos socioambientais voltaram à pauta, uma vez que o projeto estava em franco desacordo com os modos de vida tradicionais da região.

Em 2008, um fascículo do projeto Nova Cartografia Social trazia o depoimento de Maria Querobina Silva Neta, que relatava o assédio — cooptação, como registra a pesquisa — constante de representantes das empresas para que os agricultores locais entrassem no ramo do eucalipto.

“Chega aí, eles dizem: rapaz, tu vai quebrar cinco quilo de coco, tu passa o dia todo e aí tu não faz nada no correr do dia. Se tu fizer carvão, tu faz de 10 a 15 sacos de carvão por dia, e nós ficamos com esse carvão a R$4,50”, disse Querobina, que vivia do beneficiamento do coco babaçu.

Novos conflitos

O autor relata que a crise no setor das indústrias guseiras direcionou atenção para uma oportunidade com o eucalipto, que já tinha grandes áreas de cultivo após os projetos CELMAR e Ferro Gusa Carajás. Além disso, a Estrada de Ferro Carajás e a Ferrovia Norte-Sul serviriam como vias de escoamento internacional da celulose.

É onde entra a Suzano Papel e Celulose. Iniciada em 2011, a implementação também foi parte num processo de concentração de terras, que lembrou a implementação e a aquisição de terras do projeto CELMAR. Com valores muito acima daqueles considerados em termos “normais”, as pessoas venderam terras e se deslocaram para a cidade — muitas para o assentamento Vila Nova Conceição I.

É na percepção sobre o deslocamento, revelada pelos depoimentos, que os conflitos socioambientais ficam mais evidentes. “A desestruturação dos modos de vida das famílias fica evidente na escassez de espaço para implantação das roças, na situação de deslocamento compulsório das famílias da comunidade Bacaba e nos efeitos ocasionados pelo transporte das toras de eucalipto.”, diz Felipe.

O projeto acentuou os conflitos existentes e iniciados nos outros períodos (1992 e 2003), e gerou outras tensões, como a criação pela empresa de grupos de discussão com a comunidade — um deles apelidado de “Conselho da Suzano”. Com alguns benefícios, são vistos como tentativas de desmobilizar as organizações existentes.

“Os companheiros deixaram de acender a vela pra o meio ambiente pra acender a vela da grande empresa. É uma das coisas que deixa a gente muito revoltada, que eles estão tomando o espaço das organizações dos trabalhadores aqui na região”, disse Maria Querobina.

Este artigo é um destaque. Leia o texto completo na edição impressa da revista ou aqui.

 

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