Territórios e memórias: roda de conversa discute comunicação e emancipação digital dos povos amazônicos no X FOSPA

território comunicação FOSPA
Formando uma “teia”, participantes refletiram sobre o papel dos amazônicos na comunicação e cultura da região

As programações autogestionadas X Fórum Social Pan-Amazônico (FOSPA) começaram com mais de cinquenta oficinas, palestras, rodas de conversas e outras atividades. As diversas manifestações se concentraram no Espaço de Ensino Mirante do Rio, na Universidade Federal do Pará (UFPA). Os locais são chamados de casas: suas programações, segundo a organização do FOSPA, buscam promover uma integração quase fraternal entre os participantes.

A Casa dos Territórios e Autogoverno iniciou hoje (29) sua programação com uma proposta do Coletivo Manga Negra, a roda de conversa “Territórios amazônicos entre o direito à comunicação e a emancipação digital”. A premissa da atividade era discutir as questões intrínsecas às culturas comunicacionais dos povos amazônicos e seus desdobramentos no século XXI.

Thica, como prefere ser chamada a coordenadora da roda de conversa, abriu as falas mostrando o posicionamento que seria seguido, involuntariamente, por todas as outras pessoas presentes. Pontuou questões sobre a busca cultural de uma pessoa que é fruto de várias Amazônias convergidas.

“É muito louco você se enxergar nesse processo, a minha família toda é de Marabá, que é um lugar distante em todos os sentidos de Belém. Quando criança, eu sempre achei que os costumes, as comidas da minha casa eram iguais às de outras pessoas. Até eu começar a perceber que não, que tinha aquela particularidade, aquela coisa distante da realidade de quem nasceu aqui”, disse.

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Thica, coordenadora da atividade, reuniu os questionamentos da conversa em um quadro. Ana Vitória Gouvêa/Amazônia Latitude

Várias Amazônias

A discussão sobre comunicação se atrelou à identificação das várias Amazônias e ao papel cultural que cada um desses territórios tem. Trouxe dicotomias e características específicas de cada lugar que integra essa imensa Casa. Cristivan Alves, jornalista quilombola, ressaltou uma complexidade que passa despercebida.

“Como eu vou trazer uma discussão sobre internet num local, como o Quilombo do Igarapé Arirá, que não tem nem luz elétrica? O local fica ao lado de Tucuruí e usamos lamparina, vela, lanterna…”.

O papel predatório do centro-sul do Brasil em relação a projetos e à “exploração comunicacional” da Amazônia foi outro destaque. Segundo os participantes, existe uma tendência nacional de deslocar o foco dos investimentos e projetos em prol da região Amazônica para o centro-sul, promovendo um ciclo de exploração endógena no País. Parafraseando Spivak, colaboradores do coletivo Manga Negra questionaram o local de subalternidade que os povos tradicionais da Amazônia tomam em sua própria história.

Como vem sendo dito desde a Assembleia Mundial Pela Amazônia, é preciso que a Amazônia seja pensada a partir do ponto de vista das pessoas locais. Projetos tecnológicos devem ser projetados de acordo com as necessidades de cada povo, entendendo suas particularidades e seus processos.

“É preciso que as pessoas de fora entendam que o ‘desenvolvimento’ da região amazônica não vai e nem pode seguir modelos padronizados. A mudança que a gente quer não vai acontecer de fora para dentro, vai ser de dentro para fora, até mesmo de dentro para dentro”, disse Júlia Moutinho, uma das participantes da mesa.

Ao final, os participantes escreveram em um quadro os questionamentos que surgiram durante o diálogo. O coletivo Manga Negra pretende promover outras rodas de conversa após o FOSPA.

Ana Vitória Monteiro Gouvêa é graduanda em jornalismo da Universidade Federal do Pará (UFPA). Foi bolsista de iniciação científica, além de colaboradora da Revista Brasileira de História da Mídia e do projeto DivulgAí. Estagia na TV Liberal e está produzindo um documentário sobre Barcarena, vencedor do Prêmio Jovem Jornalista 2022 do Instituto Vladimir Herzog.
Imagem em destaque: Ana Vitória Monteiro Gouvêa/Amazônia Latitude
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