Estudo calcula o impacto do acordo contra gado de desmatamento na Amazônia

Política adotada pelos maiores abatedouros do mundo diminuiu o desmatamento causado pela pecuária em 15%; implementação total teria o potencial de reduzir em 50%

Gado à beira de estrada na Amazônia. Foto: Kate Evans/CIFOR

Foto: Kate Evans/CIFOR

  • Acordo entre os maiores abatedouros do mundo para não comprar gado criado em áreas de desmatamento reduziu em 15% a destruição da Amazônia pela pecuária entre 2010 e 2018
  • Se a política de desmatamento zero fosse totalmente implementada em todas as empresas de gado que operam na Amazônia, a redução teria sido de 50%
  • A complexidade das cadeias de abastecimento brasileiras e à falta de transparência de registros públicos são desafios para determinar quanto do gado em uma região estava vem de empresas com compromissos de desmatamento zero
  • O estudo da Universidade de Cambridge foi publicado em abril na revista Global Environmental Change

Um estudo da Universidade de Cambridge, revisado por pares, descobriu que alguns dos maiores abatedouros de gado do mundo reduziram o desmatamento causado pela pecuária na Amazônia em 15% –o equivalente a poupar 7 mil km² de floresta, quase o tamanho da Região Metropolitana de São Paulo– graças ao compromisso com políticas de desmatamento zero entre 2010 e 2018.

Se essas políticas fossem totalmente implementadas e adotadas em todas as empresas de gado que operam na Amazônia, 24 mil km² de floresta (uma área quase do tamanho de Alagoas) poderiam ter sido poupados nesse período. Isso representaria a redução pela metade do desmatamento causado pela pecuária no Brasil.

A pecuária é a maior causa do desmatamento na Amazônia e no mundo. O desmatamento é o segundo maior contribuinte para as emissões globais de gases de efeito estufa após o uso de combustíveis fósseis, e a Amazônia brasileira é o ponto crítico do desmatamento no mundo.

Como funciona o compromisso de desmatamento zero

Compromissos de desmatamento zero são políticas da cadeia de suprimentos que visam garantir que a produção de bens não envolva desmatamento, identificando e descartando fornecedores que produzem em áreas recentemente desmatadas de vegetação natural. Os compromissos foram assinados por muitos dos principais varejistas de carne bovina do Reino Unido, incluindo os supermercados Tesco, Sainsbury’s e Waitrose.

Embora o Reino Unido tenha importado 60 milhões de toneladas de carne bovina brasileira em 2017, de acordo com a National Beef Association, o Reino Unido é 75% autossuficiente em carne bovina. Muitas empresas britânicas estão se afastando da carne brasileira devido ao risco percebido de desmatamento. Mas os pesquisadores argumentam que esta não é a melhor abordagem.

“Podemos beneficiar o clima comendo menos carne em geral. Mas quando se trata de desmatamento, a solução não é evitar a carne bovina de países específicos – porque então perdemos nosso poder de fazer a diferença nesses lugares”, afirma Rachael Garrett, professora na Universidade de Cambridge, autora sênior do relatório.

Se comermos carne bovina importada, devemos comprá-la de varejistas que estão tentando melhorar os sistemas de produção de gado no Brasil e em outros lugares. Se um número suficiente de países se juntar ao Reino Unido e à União Eurupeia comprando apenas carne sem desmatamento, é provável que tenha um impacto positivo no planeta ao reduzir o desmatamento.
Rachael Garrett

Os resultados foram publicados em 19 de abril na revista Global Environmental Change.

Devido à complexidade das cadeias de abastecimento brasileiras e à falta de transparência de registros públicos, tem sido um desafio determinar quanto do gado em uma determinada região estava sendo comprado por empresas com compromissos de desmatamento zero. Isso impediu os esforços para analisar a eficácia das políticas de desmatamento zero ligadas à carne bovina e artigos de couro –como sapatos e bolsas.

Metodologia de pesquisa

Os pesquisadores traçaram as ligações entre regiões agrícolas, frigoríficos e empresas com compromissos de desmatamento zero no setor pecuário da Amazônia brasileira, para ver como essas ligações influenciaram o desmatamento.

Um acordo chamado G4 é o compromisso de desmatamento zero para pecuária mais difundido e fortemente implementado na Amazônia brasileira –respondendo por mais de 99% das exportações de gado. O estudo se concentrou nas empresas que adotaram o G4 e descobriu que elas estavam associadas a reduções substanciais no desmatamento.

“Mostramos que as políticas de desmatamento zero estão tendo um impacto importante –e mensurável– na proteção das florestas e que, com adoção ampla e implementação rigorosa, elas podem alcançar muito mais”, disse Garrett.

Reduzir o desmatamento em 15% já é uma quantia enorme. Mas esse resultado mostra que as políticas da cadeia de suprimentos têm limitações significativas e precisamos combiná-las com abordagens mais visionárias para ajudar países como o Brasil a melhorar seus sistemas agrícolas.
Rachael Garrett

Papel do Poder Público no compromisso de desmatamento zero

Os pesquisadores dizem que é necessária uma combinação de intervenções dos setores público e privado para melhorar as práticas de criação de gado e ajudar a eliminar o desmatamento em países como o Brasil.

As intervenções do setor público podem incluir apoio a atividades econômicas alternativas e incentivos financeiros, ou maior pressão do governo brasileiro para evitar o desmatamento.

“Com essa evidência, os supermercados podem usar a influência deles para ajudar a melhorar a pecuária brasileira. Mas é preciso fazer mais para melhorar o rigor das políticas corporativas e a cobertura de mercado dos adotantes de políticas, mesmo em regiões relativamente bem cobertas, como a Amazônia brasileira”, disse Sam Levy, da Universidade de Nova York, autor principal do relatório.

*Texto traduzido e adaptado a partir de material publicado pela Universidade de Cambridge
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