Maquiagem verde: as ações “inúteis” da Chevron para diminuir emissão de carbono e os riscos para a Amazônia
Corporate Accountability mostra que créditos de carbono comprados pela empresa que é a segunda maior petrolífera dos Estados Unidos “parecem problemáticas”
Resumo:
- Mais de 90% das compensações de carbono que a Chevron retirou por meio do mercado voluntário para “cancelar” suas emissões parecem não ter valor;
- Esquemas nos quais a Chevron investe como parte do seu plano “net zero” estão ligados a alegações de abuso da comunidade local, degradação ambiental ou podem estar aumentando as emissões;
- A Chevron investe milhões anualmente para manipular a vontade política de ação climática, buscando moldar a política climática de acordo com a sua vontade.
Um relatório da Corporate Accountability revela que as ações praticadas pela Chevron para diminuir a emissão de carbono são “inúteis” e com baixo reparo ambiental. Considera uma das maiores geradoras de energia do mundo, é também uma das grandes petrolíferas no Brasil.
Em apenas um ano, a Chevron dobrou seu lucro líquido, atingindo 36,5 bilhões de dólares, quase R$ 2 trilhões, com grande participação do preço do petróleo no mercado internacional. Contudo, conforme o relatório, a poderosa empresa criou estratégias para maquiar a agenda verde e servir de exemplo para outros empresários ludibriar a pauta climática global.
Companhias comprometidas com o clima ganham créditos de carbono quando deixam de emitir gases poluentes. Entretanto, para garantir os créditos de carbono, a Chevron usou estratégias questionáveis entre 2020 e 2022, que levaram à conclusão de que 93% das atitudes ditas como compensatórias, não passaram de uma cortina de fumaça.
O relatório resume que 50,82% dos créditos vieram de atividades com baixa integridade ambiental; 42,29% são oriundos de créditos com baixa integridade ambiental e impactos ambientais e sociais negativos; enquanto 6,89% são de atividades desconhecidas. Dessa forma, o relatório crava que as atividades praticadas pela empresa parecem ser inúteis.
“Como resultado, os perigosos esquemas de distração do setor – como compensações de carbono – agora são cada vez mais usados pelos tomadores de decisão como os principais componentes da ação climática global em vez de expedientes comprovados, econômicos e equitativos”, indica.
Outros impactos negativos
A Chevron não apenas buscou créditos em atividades meramente ambientais, mas se alinhou a movimentos que causam enorme impacto ao meio ambiente. A investigação da Corporate Accountability desvendou que quase 54% dos créditos de compensação voluntária, adquiridos por meio do CCA e MDL, são compensações de barragens hidrelétricas, como El Quimbo e Sogamoso, na Colômbia.
“É revelador que a Chevron tenha priorizado compensações compradas por meio desses grandes projetos sem sentido de barragens hidrelétricas nos últimos anos. Em 2020, grandes projetos hidrelétricos mal apareceram em seu portfólio voluntário de compensações de carbono. Um ano depois, eles representavam mais da metade (52,69%) de suas compensações voluntárias de carbono. E em 2022, quase todas (97,53%) das compensações voluntárias de carbono da Chevron foram grandes projetos hidrelétricos”, contesta o documento.
A empresa também está vinculada a um projeto que se instalou em terra indígena, bem como a iniciativas de plantio agrícola para extração de borracha que contribuíram com o desmatamento. Além disso, a Chevron aproveitou as plantações para comprar créditos de carbono por um preço bem abaixo do praticado no mercado.
“Quando as ações da Chevron não demonstram um compromisso significativo em diminuir emissões na fonte e em interromper a expansão de combustíveis fósseis, ela produz emissões evitáveis que ajudam a provocar um maior aquecimento de temperatura e que, por sua vez, estimulam desastres relacionados às mudanças climáticas mais mortais e mais frequentes”, acrescenta o relatório.
Esconde-esconde e fracasso
Atrelado a isso, a investigação trouxe ainda informações de projetos da Chevron que resultaram em fracasso e não cumpriram com o objetivo de ajudar o meio ambiente, como o Gorgon que não alcançou 50% das metas. “Mais recentemente, o projeto está associado a um aumento de emissões”, pondera o documento.
O relatório da Corporate frisou também que a Chevron leva em consideração, para dizer que cumpre as metas da agenda climática, apenas as emissões de gases dos espaços e máquinas usados pela empresa e da energia usada na companhia. Contudo, ficam de fora os poluentes lançados pelos produtos utilizados pelos consumidores, que representam 90% da emissão de carbono.
“Em vez de serem consideradas pelo valor de face, as promessas de ‘net zero’ da Chevron podem ser presumidas como ações que não levam a reduções significativas de emissões e que possuem risco de causar danos, até ou a menos que se prove o contrário”, rebate o documento.
E no Brasil?
Essas emissões estão vinculadas à atuação da Chevron no Brasil, por meio da exploração de petróleo. A companhia pretende investir 57,4 bilhões de dólares em expansão de petróleo até 2030, o que pode chegar a outras regiões alvo de embate de autoridades e instituições.
A exploração em áreas de conservação voltou ao cerne da discussão na semana passada, quando o Ibama negou perfurar um poço de petróleo na foz do Rio Amazonas, no Amapá. A estatal aguardava esse aval para fazer uma perfuração de teste a cerca de 175 quilômetros da costa.
O presidente Lula declarou à imprensa que acha “difícil” a iniciativa provocar danos à região amazônica, que vem sendo castigada pelo garimpo; a ministra do meio ambiente, Marina Silva, falou em respeito à decisão, já que vivemos em uma democracia; enquanto a Petrobras pretende acionar a Justiça para derrubar o parecer do Ibama.
Por sua vez, a A diretora da Campanha Climática para América Latina da Corporate Accountability, Nathalie Rengifo Alvarez, afirma que o governo brasileiro precisa estar atento às necessidades das comunidades.
“O governo brasileiro deve atender aos chamados das comunidades globais que demandam que se interrompa a exploração de combustíveis fósseis, que se ouça a ciência climática e que mude a matriz energética. É urgente que protejamos a Amazônia. É urgente que se proteja a vida acima dos lucros”, declarou.
Para ela, o que a Petrobras pretende não é menos prejudicial para o mundo do que vem fazendo a Chevron na América Latina. “Todos esses planos de exploração e expansão de petróleo na América Latina estão nos condenando à destruição e à morte”, falou.