Em luta pela educação indígena, etnias ocupam secretaria em Belém

Protesto pede revogação de nova lei que acaba com garantias para programa de educação nas aldeias e exoneração de secretário de educação do Pará

Os manifestantes mantiveram, desde o primeiro momento, uma ocupação pacífica. Foto: Elielson Almeida / Amazônia Latitude
Os manifestantes mantiveram, desde o primeiro momento, uma ocupação pacífica. Foto: Elielson Almeida / Amazônia Latitude
Os manifestantes mantiveram, desde o primeiro momento, uma ocupação pacífica. Foto: Elielson Almeida / Amazônia Latitude

Os manifestantes mantiveram, desde o primeiro momento, uma ocupação pacífica. Foto: Elielson Almeida / Amazônia Latitude.

Há mais de 10 dias indígenas de várias etnias ocupam a sede da Secretaria de Estado de Educação do Pará (Seduc), em Belém. Eles pedem a revogação da Lei nº 10.820 promulgada no final do ano passado e a exoneração de Rossieli Soares, atual secretário de educação.

Para os povos originários, as pautas são essenciais para a garantia da educação pública de qualidade para crianças e jovens indígenas.

Gráfico da população indígena no Brasil. Fonte: Censo Demográfico 2022: Indígenas - Primeiros Resultados do Universa

Gráfico da população indígena no Brasil. Fonte: Censo Demográfico 2022: Indígenas – Primeiros Resultados do Universa

De acordo com o IBGE, há 1.693,535 indígenas no Brasil. Eles são 0,83% da população e o Pará é o sexto estado mais populoso quando se trata de povos tradicionais do país, com 80.974 indígenas, o equivalente a 1% da população paraense.
Um dos principais temores de professores e comunidades tradicionais que se juntaram ao protesto que se mantém desde o dia 14 de janeiro em Belém é a substituição do Sistema Modular de Ensino Indigena (Somei) e o uso de aulas à distância na educação nas aldeias.

“Ainda não tivemos resposta da nossa principal pauta, que é a revogação por completo da Lei e, também, a exoneração do secretário. Um secretário que é altamente violento. É um secretário que trouxe muitos problemas por onde ele passou e é o que ele está trazendo para o estado do Pará. Mal chegou e já trouxe um pacote de retrocessos, um pacote de maldades”, disse Auricélia Arapiuns, indigena da Região do Baixo Tapajós.

Nova Lei do Magistério

O Sistema Modular de Ensino Indigena (Somei) foi criado em 1982 para garantir a educação presencial em terras indígenas localizadas em áreas remotas. No entanto, o programa estadual de educação, que existia há mais de 40 anos, foi extinto após a aprovação da Lei nº 10.820, que ficou conhecida como “Nova Lei do Magistério”.

A nova legislação foi aprovada em caráter de urgência no final de 20241Na ocasião, professores e outros servidores da rede pública foram atingidos por balas de borracha e spray de pimenta pelo batalhão de choque da Polícia Militar ao realizarem um ato em frente à Alepa contra a aprovação do projeto., sem ser discutida entre os deputados na Assembleia Legislativa do Pará (Alepa).

A regulamentação determina alterações no sistema de gratificações do Somei, que antes eram pagas em valores fixos de R$ 7 mil reais. Agora, os valores dependem de níveis de complexidade territorial, variando entre R$ 1 mil e R$ 7 mil reais.

Segundo as lideranças indígenas, as alterações nas gratificações tornam inviável a manutenção das aulas presenciais em territórios tradicionais.

O receio dos manifestantes é que a educação seja substituída por um modelo de ensino à distância, mesmo com a carência de energia elétrica e internet em diversas aldeias.

Eles denunciam, ainda, que além de manter despesas como transporte, moradia e alimentação, as gratificações do Somei ajudavam a custear itens básicos da educação indígena que deveriam ser garantidos pelo poder público, como a merenda escolar das crianças. Para Gideão Arapius:

‘’Quem conhece a nossa realidade somos nós. Quem conhece a realidade do Some e do Somei somos nós. Quem conhece as grandes dificuldades da falta de infraestrutura da educação indigena, no estado do Pará como um todo, somos nós porque estamos nessas áreas remotas da Amazônia muito grande. Estamos juntos para reivindicar essa lei que acabou com o direito à educação dos povos indígenas”.

As lideranças também denunciam que, mais uma vez, a Lei de Consulta Prévia não foi respeitada pelo Governo do Pará. O protocolo de consulta é um direito dos povos indígenas garantido desde a Convenção 169 sobre os Povos Indígenas e Tribais, adotada em Genegra, em 1984.

Mesmo sendo o país com o maior número de comunidades tradicionais da América do Sul, a convenção só foi ratificada no Brasil em 2002 e promulgada em 2004. Desde então, é obrigatória a consulta antes de qualquer decisão legislativa que possa afetar a vida dos povos indígenas.

A revista Amazônia Latitude foi um dos primeiros veículos de comunicação a chegar na ocupação. E vem acompanhando, diariamente, as movimentações no movimento de resistência indigena. Também fomos uma das primeiras equipes de jornalismo a entrar no prédio, após o deferimento de uma liminar na justiça que garantiu o exercício pleno da imprensa na ocupação.

Acompanhe, agora, uma linha do tempo da ocupação pacífica de etnias na sede da Seduc, em Belém:

Dia 1 – 14 de janeiro de 2025

No primeiro dia de ocupação, indígenas de diversas etnias reuniram em frente à sede da secretaria de educação do Pará, em uma das principais avenidas de Belém. Entoando cânticos indígenas, os manifestantes solicitaram uma reunião com autoridades do governo do estado, mas tiveram o pedido recusado. Sem autorização, os indígenas tiveram que forçar a entrada. Uma vez do lado de dentro, eles ocuparam, pacificamente, o local.

Conhecida internacionalmente pelo ativismo em defesa do meio ambiente, Alessandra Korap é uma das lideranças indígenas presentes na ocupação. Ela faz parte do povo munduruku, a etnia mais numerosa da região do Médio Tapajós.

Em 2023, Alessandra foi agraciada com o prêmio Nobel do meio ambiente por conta da sua atuação na defesa da invasão de garimpeiros ilegais na T.I Munduruku. Além de trazer mais visibilidade para o movimento, Alessandra tem garantido a unificação das demandas dos povos tradicionais.

“O estado do Pará tem vários povos, mais de 50 povos indígenas. Imagine uma TV falando uma língua e os alunos não entendendo o que o professor está falando na TV. Aulas online não servem pra gente porque muitos alunos não falam portugês. Isso é violação de direitos, violação da nossa cultura. Isso é muito grave”, disse a ativista indígena.

Os ocupantes também denunciam que a energia do prédio foi cortada e spray de pimenta chegou a ser lançado dentro do local, em uma tentativa de desmobilizar a ocupação.

Dia 2 – 15 de janeiro de 2025

Na manhã do dia 15 de janeiro, a ocupação indigena na Seduc havia completado 24 horas, mas os manifestantes ainda não haviam sido ouvidos formalmente pelo Governo do Estado.

Para a líder indígena Auricélia Arapium, que representa as etnias da região do Baixo Tapajós, o silêncio das autoridades era uma tentativa de vencer os manifestantes pelo cansaço.

“Mal sabem eles que nós não estamos sós aqui. Os nossos antepassados e os nossos encantados estão aqui conosco e vão continuar nos dando força. A gente luta há mais de 500 anos e jamais nos cansaremos. A nossa força é ancestral. A nossa luta também é espiritual. E eles não nos vencerão”.

Apesar da presença ostensiva de policiais do Batalhão de Choque da Polícia Militar do Pará, os manifestantes mantiveram, desde o primeiro momento, uma ocupação pacífica. Também não havia qualquer registro de depredação do prédio.

“O Governo do Pará transformou a Secretaria de Educação do Estado em um batalhão de Polícia. Hoje, a Seduc é um batalhão de polícia. Não dá pra se pensar em uma secretaria de educação tomada pelo poder da polícia”, disse o professor indígena, Poró Borari.

Dia 3 – 16 de janeiro de 2025

No terceiro dia de manifestação, os portões da Seduc permaneciam fechados. Cerca de 100 quilombolas do território Amarquauta, na região do Alto Acará, tiveram que passar a noite na rua porque tiveram o acesso ao prédio negado por policiais militares.

Mesmo com uma recomendação do Ministério Público Federal (MPF) solicitando a liberação do portão, a imprensa e membros da Comissão de Direitos Humanos da OAB também foram impedidos de entrar na ocupação.

“A gente gostaria de chegar aqui com os portões abertos. A gente ainda não teve nenhuma resposta. A gente entende que, na verdade, quando a gente faz essa requisição, a gente está dizendo qual o nosso posicionamento. A gente acha que isso deveria estar aberto desde o primeiro dia”, afirmou o procurador da república,Rafael Martins.

A Eliete era uma das quilombolas que precisou dormir na rua. Ela teme que a Lei nº 10.820 prejudique ainda mais a educação nas comunidades remanescentes.

Mesmo com mais de 250 anos de existência, o território Amarquauta possui apenas uma escola de ensino fundamental, mas nunca foi beneficiado pelo Some. Para dar continuidade nos estudos, os jovens precisam sair do quilombo e se mudar para a cidade.

“É muito raro ter alguém que concluiu o ensino médio na nossa comunidade. A única escola que tinha lá, de madeira, caiu. Para um aluno estudar, cursar, tem que se deslocar para cidade e morar na casa de parentes e perder a sua cultura, lamentou Eliete Santos, coordenadora de ação social e saúde do quilombo Amarquauta.

Dia 4 – 17 de janeiro de 2025

Depois de mais de 96 horas de resistência, gestos de solidariedade não paravam de chegar à ocupação. Doações de diversas partes do estado ajudavam a manter a manifestação indígena na sede da Secretaria de Educação do Pará, a Seduc.
Além da limpeza, os indígenas também se preocupam com a organização do local. Todos objetos pessoais dos servidores da Seduc foram mantidos exatamente da mesma forma que foram deixados. A Mila é uma das responsáveis por organizar a limpeza e a distribuição dos alimentos.

“Ninguém quebrou nada. Está tudo limpinho. As refeições estão sendo feitas nos corredores. As redes e as barracas estão sendo colocadas lá fora. Aqui nós também temos crianças e mulheres grávidas. Então, o espaço está limpinho”, contou a professora.

Distantes milhares de quilômetros de suas terras, os indígenas também se preocupavam em manter a identidade dos seus povos. O fotógrafo Thaigon Arapiun contou com a ajuda de amigos para reforçar a pintura corporal indígena.

“Faz semanas que nós estamos viajando. Se for somar quando nós saímos de lá, até chegar aqui, já tem uma semana. Então, o nosso grafismo já está sumindo. Estamos aqui, fazendo um reforço, porque é muito importante fortalecer o nosso grafismo. Não só a identidade, mas também espiritualmente. A gente acredita muito na força do jenipapo e na força do urucum, na força do barro. E estamos aqui fortalecendo, contou o comunicador.

O Jonas Waiwai, do oeste do Pará, trouxe peças de artesanatos da etnia dele para uma ocupação. Uma forma de valorizar e manter viva a cultura dos povos tradicionais.

“É uma cultura que a gente carrega. Principalmente na hora da dança e, também, nas festividades, a gente usa isso. Então, isso aqui é tipo uma mostra que faz parte da nossa cultura”, disse o artesão.

No final da noite, uma pequena comitiva de integrantes do Governo do Estado aceitou se reunir no auditório da Seduc e ouvir, pela primeira vez, as demandas dos povos tradicionais. O secretário de Educação do Pará, Rossiele Soares, e o Procurador Geral do Estado, Ricardo Feffer, estiveram presentes na reunião.

No entanto, o primeiro encontro formal entre as duas partes foi encerrado sem uma definição. Após ouvir dezenas de lideranças indígenas, o secretário de educação encerrou as discussões com a justificativa de que, naquele momento, a comitiva do Governo do Estado iria se reunir na Casa Civil para discutir a possível revogação da Lei nº 10.820.

Distantes milhares de quilômetros de suas terras, os indígenas também se preocupavam em manter a identidade dos seus povos. Foto: Elielson Almeida / Amazônia Latitude.

Distantes milhares de quilômetros de suas terras, os indígenas também se preocupavam em manter a identidade dos seus povos. Foto: Elielson Almeida / Amazônia Latitude.

Dia 5 – 18 de janeiro de 2025

Quando a ocupação completou cinco dias, os manifestantes mostraram que a resistência também pode ser manifestada através da arte. Sem autorização para entrar, dois grupos de carimbó organizaram uma roda em frente ao prédio da Seduc.

Um dos grupos foi o Toró-Açu, do quilombo Abacatal, distante cerca de 8 Km do centro de Ananindeua, na região metropolitana.

“Carimbó é resistência e nossa luta está na ancestralidade. A luta dos nossos antigos sempre será lutada no agora. Saudações ancestrais aos que se fazem presente na luta”, disse o vocalista do Grupo, Paulo Otas.

Os manifestantes mostraram que a resistência também pode ser manifestada através da arte. Foto: Elielson Almeida / Amazônia Latitude.

Os manifestantes mostraram que a resistência também pode ser manifestada através da arte. Foto: Elielson Almeida / Amazônia Latitude.

Dia 6 – 19 de janeiro de 2025

No dia 19 de janeiro, no 6° de ocupação, a manifestação se estendia para além do prédio da Seduc. Uma manifestação bloqueou o quilômetro 922 da BR-163, em Belterra, no oeste do Pará. Para a Guerreira do povo Mundurucu, Maria Leusa, os povos indígenas devem continuar resistindo até terem os seus direitos garantidos.

“Essa lei atingiu o futuro dos nossos filhos, o futuro do nosso povo. Nós queremos que respeitem apenas a nossa Constituição. Nós, mãe, vamos continuar nessa luta. Nós sabemos o que queremos. Nós não queremos esse tipo de educação que querem levar para as nossas aldeias. Queremos a garantia da consulta prévia e livre para o nosso povo. Nós não vamos aceitar qualquer tipo de projeto que vai destruir a educação do povo Mundurucu”.

Dia 7 – 20 de janeiro de 2025

A ocupação completou uma semana sem qualquer tipo de previsão para ser encerrada. As negociações sobre as principais reivindicações dos indígenas ficaram paralisadas desde o final da noite da última sexta-feira (18), quando uma comitiva com integrantes do Governo do Pará aceitou ouvir, pela primeira vez, as demandas dos manifestantes. Mais de 48 horas após a reunião, nada de concreto havia sido definido.

“Ainda não tivemos resposta da nossa principal pauta, que é a revogação por completo da Lei e, também, a exoneração do secretário. Um secretário que é altamente violento. É um secretário que trouxe muitos problemas por onde ele passou e é o que ele está trazendo para o estado do Pará. Mal chegou e já trouxe um pacote de retrocessos, um pacote de maldades”, contou Auricélia Arapiun.

Para fortalecer o movimento, caravanas de etnias do Baixo Tapajós e do Alto Rio Guamá desembarcaram em Belém no sétimo dia de ocupação.

Naquele momento, outras caravanas, vindas de diversas partes do estado, também estavam na estrada com o objetivo de massificar o movimento.

O sétimo dia de ocupação também foi marcado por um pedido de reintegração de posse solicitado pelo Governo do Estado.

Segundo a decisão, o movimento indígena estaria atrapalhando o fluxo de trabalho da Seduc há uma semana. Por isso, foi solicitado que eles liberassem as áreas administrativas. As lideranças contestaram as alegações apresentadas à justiça.

“Em nenhum momento nós não impedimos qualquer servidor de trabalhar. A CEIND está trabalhando normalmente desde o primeiro dia. Em momento algum nós não impedimos. Nós continuamos ocupando, mas sem impedir nenhum servidor, jamais. Está posto para a sociedade que nós vamos prejudicar mais de 40 mil servidores. É muito contraditório porque quem está prejudicando os servidores é justamente o Governo com a aprovação dessa Lei, afirmou Auricélia Arapium.

Em meio ao cenário de tensão, os manifestantes tentam amenizar o clima para as crianças indígenas e quilombolas que participam da ocupação. Por meio de doações, um espaço com brinquedos e livros infantis foi montado para humanizar a ocupação.

“É um espaço de acolhida para as crianças dos manifestantes que chegam. Indígenas, quilombolas, de movimentos sociais. Para criar essa questão da humanização, porque aqui a luta está sendo pela educação, por eles. Então, nada mais do que inseri-los dentro do contexto criando um espaço para eles também, contou a servidora pública Rafaela Gurjão.

Neste dia, foi a primeira vez que a imprensa teve o direito de entrar no prédio. A cobertura mais perto dos manifestantes só foi possível por conta de uma liminar da justiça, solicitada pelo Sindicato dos Jornalistas do Pará (Sinjor), solicitando o direito livre da imprensa na ocupação.

Um espaço com brinquedos e livros infantis foi montado para humanizar a ocupação. Foto: Elielson Almeida / Amazônia Latitude.

Um espaço com brinquedos e livros infantis foi montado para humanizar a ocupação. Foto: Elielson Almeida / Amazônia Latitude.

Dia 8 – 21 de janeiro de 2025

Após mais de uma semana de ocupação, um movimento isolado, formado em maioria por povos indígenas que fazem parte da base de apoio do Governo, participaram de uma reunião com autoridades do Governo do Estado, no prédio do Centro de Formação de Profissionais da Educação Básica do Pará (CEFOR), no bairro da Campina.

Durante a reunião com o movimento indígena da base do Governo, foi definido a criação de um Grupo de Trabalho para elaborar o Projeto de Lei da Política Estadual de Educação do Pará. As discussões serão realizadas sem as lideranças do movimento que ocupa a Seduc.  

Uma das principais solicitações dos manifestantes é sobre a participação massiva de todos os representantes do movimento na reunião com o Governo do Estado. Por isso, desde o primeiro dia, os indígenas solicitaram que o encontro fosse realizado no auditório da Seduc, para contemplar todos os manifestantes, ainda que fosse apenas para ouvir. Segundo as lideranças, não havia qualquer possibilidade de reunião fechada, em comissão, uma vez que o Pará possui mais de 50 etnias, com múltiplas línguas e culturas.

Em reuniões do Grupo de Trabalho não há representantes dos povos que ocupam a Seduc desde o dia 14 de janeiro. Foto: Rodrigo Pinheiro / Agência Pará.

Em reuniões do Grupo de Trabalho não há representantes dos povos que ocupam a Seduc desde o dia 14 de janeiro. Foto: Rodrigo Pinheiro / Agência Pará.

Por conta disso, os manifestantes apresentaram ao Governo a proposta de elaborar a Política Estadual de Educação dos Povos Indígenas, em comissão, após a revogação da Lei 10.820. Mas a demanda não foi atendida pelas autoridades.

“Não basta o Governador atender as nossas demandas e a gente ficar super felizes e voltarmos para as nossas aldeias. Isso já aconteceu várias vezes, inclusive em reuniões com participações do MPF. Ele sempre diz que vai resolver os problemas em alguns dias, mas sempre que a gente vira as costas as nossas demandas são engavetadas. Enquanto a revogação não sair no diário oficial, a gente não vai ter sucesso. Eu sei que o povo está cansado e a luta é árdua, mas eu acredito que os espíritos dos nossos ancestrais estão nos fortalecendo”, contou o professor Poró Borari.

Para a ativista Auricélia Arapium, qualquer negociação para a desocupação do prédio é inegociável antes da revogação da Nova Lei do Magistério e da exoneração do secretário de educação.

“Nós não saímos das nossas terras para negociar os nossos direitos constitucionais. Nós só vamos sair daqui quando eles estiverem garantidos. Os nossos direitos não prescrevem. Por isso, a gente não aceita sentar só com o secretário de educação. Quem vai revogar a lei não é ele, é o Governador. Se não for resolvido, vamos massificar ainda mais o movimento. Vamos fazer o chamamento geral para os povos vierem para cá e vamos fechar as BRs”, afirmou.

Uma das principais solicitações dos manifestantes é sobre a participação massiva de todos os representantes do movimento na reunião com o Governo do Estado. Foto: Elielson Almeida / Amazônia Latitude.

Uma das principais solicitações dos manifestantes é sobre a participação massiva de todos os representantes do movimento na reunião com o Governo do Estado. Foto: Elielson Almeida / Amazônia Latitude.

DIA 9 – 22 de janeiro de 2025

Prestes a completar 10 dias de ocupação, uma foto do secretário de educação, Rossieli Soares, usando adereços e pinturas indígenas revoltou os manifestantes. Na publicação, o titular da Seduc exaltava o compromisso do estado com a educação indígena no Pará.

Para os manifestantes, foi mais uma tentativa de mascarar o diálogo inexistente com o movimento.

“A incapacidade de diálogo do estado com os povos indígenas mostra a sua falta de respeito com essas comunidades. Criar uma portaria sem a consulta aos povos indígenas que estão aqui no movimento de ocupação é mais uma falta de respeito”, disse o líder Kamirã Tembé.

Para o líder indígena Gideão Arapium, toda e qualquer tentativa do Governo de separar o movimento não terá êxito.

“É uma reunião que não nos representa e não prejudica o nosso movimento. A nossa ocupação continua firme e forte. Existe uma tentativa de cooptar as lideranças com promessas que nunca foram cumpridas, há vários anos. Mas, o resultado que eles obtiveram é o resultado na nossa luta, porque começou aqui”, contou.

 

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DIA 10 – 23 de janeiro de 2025

Uma liminar concedida pela Justiça Federal determinou a retomada urgente dos trabalhos administrativos na sede da Secretaria de Estado de Educação do Pará (Seduc). A orientação era que os manifestantes se limitem ao refeitório e ao auditório do local.

Em nota publicada na Agência Pará de Notícias, o Estado disse que “reconhece o direito de manifestação dos indígenas, respeita, compreende e continua o diálogo”.

A decisão causou indignação entre os manifestantes e também nos professores e demais representantes de comunidades tradicionais que aderiram ao movimento. A pergunta é: Como o direito à livre manifestação pode ser respeitado se a Justiça é quem determina onde os manifestantes podem ficar?

Imagens que circulam nas redes sociais, mostram pessoas que seriam policiais militares arrancando faixas dos indígenas que estavam fixadas na entrada da Seduc desde o início da ocupação.

Enquanto isso, o Ministério Público Federal (MPF), voltou a pedir à Justiça Federal que proíba o Governo do Pará de adotar a Educação à Distância (EaD) em substituição às aulas presenciais em comunidades tradicionais.

O MPF divulgou uma nota técnica recebida pelo Ministério da Educação (Mec) que assegura que a legislação brasileira não prevê ensino à distância para povos e comunidades tradicionais.

O mesmo MPF também divulgou um documento que recebeu em setembro de 2024 sobre a intenção de virtualizar o ensino para indígenas em 2025.

Segundo o Ministério Público, o documento, o titular da Seduc, Rossieli Soares da Silva, encaminha ao MPF posicionamento da diretoria de Planejamento de Rede da Seduc em que é informado que a implantação do ensino médio na aldeia Itapeyga, na Terra Indígena Parakanã, será feita este ano via Centro de Mídias da Educação Paraense (Cemep).

Em diversos pronunciamentos públicos, o secretário Rossieli Soares da Silva alegou que a nova Lei do Magistério não afeta o Somei e que não há intenção de substituir a educação indígena presencial pela virtual.

Para lideranças indígenas e para o MPF, a nova lei põe fim ao regime presencial de ensino.

Texto e cobertura: Elielson Almeida
Montagem da página e acabamento: Alice Palmeira
Revisão: Glauce Monteiro
Direção: Marcos Colón

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