“Para se fazer política pública, o que se precisa primeiro? Informação”

problema ambiental
Em conversa com a Amazônia Latitude, Pedro Rapozo, sociólogo e professor da UEA, fala sobre a parceria entre universidade, sociedade e instituições em prol de povos tradicionais


No ar, o quarto Latitude Podcast! Programa no qual debates os processos históricos, socioculturais e políticos da região amazônica, buscando examinar o desenvolvimento de uma violência lenta sobre seus territórios.

Neste programa,  falamos com Pedro Rapozo, docente da Universidade do Estado do Amazonas (UEA) em Tabatinga-AM, e integrante do Núcleo de Estudos Socioambientais da Amazônia (NESAM), que há alguns anos trabalha junto à universidade na faixa de fronteira do Alto Solimões, pensando as principais questões socioambientais de gestão territorial com povos e comunidades indígenas tradicionais, com foco na cartografia dos conflitos socioambientais, pensando uma tipificação desses conflitos e sua relação com o narcotráfico.

Doutor em sociologia, Pedro fala sobre o envolvimento do narcotráfico com a extração ilegal de recursos naturais em terras indígenas, unidades de conservação e territórios de comunidades tradicionais na tríplice fronteira entre Brasil, Peru e Colômbia, um dos principais corredores de entrada de cocaína no país.

Nós temos aqui um mercado ilícito movimentado pelo narcotráfico, que agencia comunidades rurais, e evidentemente acaba maximizando suas divisas, os seus lucros, através da atividade comercial de exploração dos recursos naturais. Dentre eles, eu poderia citar a pesca, o tráfico de pescado dentro de território indígena, o agenciamento de comunidades que trabalham com a produção da coca, ou mesmo a exploração da madeira e do garimpo, que são em parte atividades onde são injetados recursos advindos do narcotráfico. Uma espécie de lavagem de dinheiro e maximização da divisa dos recursos obtidos com essas atividades ilegais”, afirma o sociólogo.

Essas informações foram obtidas através de análises de dados socioterritoriais apreendidos pelo NESAM, que dentre outras atividades, auxilia povos indígenas e comunidades tradicionais do Alto Solimões. Fazem isso através da cartografia social, categoria de mapeamento desenvolvida junto das comunidades envolvidas com a finalidade de registrar, segundo a visão de seus habitantes, os territórios, localidades sagradas e pontos de conflitos socioambientais.

O mapa, que é produzido como um croqui, é trabalhado pelo NESAM de forma a qualificar as informações ali apresentadas para que possam auxiliar as instituições competentes (Funai, MPF) na resolução dos conflitos e na coleta de dados demográficos e geográficos dessas comunidades.

Além disso, o NESAM trabalha com o conceito de re-existênciastermo que une os significados de “resistir” e “existir”, e refere-se à organização e mobilização política de comunidades tradicionais frente aos conflitos socioambientais e interesses econômicos aos quais estão submetidos.

Quando falamos em “re-existência”, falamos em uma reafirmação, uma persistência, uma resistência, de existir, de compreender, de visibilizar o modo de vida, de usar o território – esse território, evidentemente, dos povos indígenas, das comunidades ribeirinhas, é um território político, marcado por relações de poder, pela apropriação social da natureza diferente de uma perspectiva mercadológica. Se a gente parar para analisar que o mercado local, ele se utiliza de uma perspectiva de utilizar os recursos naturais”, explica Pedro.

A relação do NESAM com as instituições públicas, responsáveis por formular políticas e tomar ações em prol dessas populações invisibilizadas, permite que os pesquisadores possam adentrar terras indígenas, comunidades ribeirinhas e quilombolas, para a coleta de dados e o diálogo com essas populações. O Núcleo de Estudos chegou à essas articulações perseguindo um objetivo primário – produzir informações técnicas e municiar as instituições para que possam tomar ações concretas para resolver os problemas dos povos do Alto Solimões.

Para o professor Pedro Rapozo, a falta de pessoal técnico para coleta, avaliação e qualificação de informações não é um problema restrito às fronteiras, se repete em grande parte do território nacional.

Tentamos, dentro desse contexto, mais do que sensibilizar essas instituições a procurar resolver os problemas das comunidades, dos territórios indígenas, ter um olhar mais sensível a partir dessas informações, como o olhar socioantropológico, geográfico, ambiental, para que as decisões tomadas por essas instituições considerem a realidade e a fala desses indivíduos, desses agentes impressos nos documentos que produzimos”, finaliza Pedro Rapozo.

 

Pedro Rapozo é Doutor em Sociologia – Desenvolvimento e Políticas Sociais pela Universidade do Minho/UM. Também é professor de graduação e de cursos de pós graduação na UEA, além de ser Coordenador do grupo de pesquisa Núcleo de Estudos Socioambientais da Amazônia (NESAM) vinculado ao CNPq.
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