Pisar Suavemente na Terra: O líder Munduruku do Planalto Santareno

Manoel Munduruku, cacique da aldeia Ipaupixuna, durante o dia, segurando um instrumento tradicional. Ele usa um cocar com penas azuis.
O cacique da aldeia Ipaupixuna é uma das lideranças munduruku ativas no mais novo episódio de resistência desse povo. (Foto: Marcos Colón/ Amazônia Latitude)
Manoel da Rocha Munduruku, cacique da aldeia Ipaupixuna, é uma das personalidades que lutam contra os megaprojetos e a monocultura de soja na Amazônia

O cacique Manoel da Rocha Munduruku é líder da aldeia Ipaupixuna, que compõe a Terra Indígena (TI) Munduruku e Apiaká do Planalto, ao lado das aldeias Açaizal, São Francisco da Cavada e Amparador. O nome da TI vem de sua localização, na extensão do Planalto Santareno, onde fica a cidade de Santarém, no Pará. Indígenas dos povos Apiaká e Munduruku vivem na TI.

Ao longo da história, os Munduruku foram guerreiros. Seja em disputas com outros povos em uma época em que o Brasil ainda não era Brasil. Ou quando os europeus chegaram às terras amazônicas, na disputa com os novos invasores — os homens brancos.

Desde então, os motivos da resistência munduruku foram se afunilando por motivos de (sobre)vivência: direitos, terras, saúde — itens ameaçados principalmente pela expansão agressiva do agronegócio.

O cacique da aldeia Ipaupixuna é uma das lideranças munduruku ativas no mais novo episódio de resistência desse povo. Manoel é coordenador do Conselho Munduruku do Planalto, representante de quatro aldeias do povo Munduruku e cinco aldeias do povo Apiaká.

“Nossa terra está sendo invadida pelo agronegócio, e nós estamos enfrentando sérios problemas”, Manoel alertou o Conselho Indigenista Missionário (CIMI) em 2019. “A gente sofre pelo desmatamento e a gente sofre pelo agrotóxico”.

Ao longo dos anos, ele e outras organizações indígenas denunciaram a ação de grandes produtores de soja que utilizam áreas da TI para monocultura. Além de invadir um território que é dos Munduruku e Apiaká há séculos, os “sojeiros” — como são chamados nas aldeias — desmatam a floresta, a vegetação dos igarapés, ameaçam os líderes indígenas e quilombolas da região e poluem o solo e a água com agrotóxicos.

De acordo com o cacique, os sojeiros também querem construir um porto no Lago do Maicá. O porto é um projeto da Empresa Brasileira de Portos de Santarém (Embraps) e será utilizado para o transporte de soja. Dentro da TI Munduruku e Apiaká do Planalto, há vários igarapés que deságuam no lago. É nesse curso d’água que os indígenas pescam, atividade que faz parte da economia dos dois povos e complementa a alimentação nas aldeias Ipaupixuna e São Francisco da Cavada. Com o porto, a pesca tradicional seria prejudicada.

Outros perigos que se instauraram sobre o lago são a derrubada da vegetação no entorno para a monocultura de soja e a pesca predatória das espécies.

“O Maicá é um lago muito rico de pirarucu, tambaqui, aracu, curimatã. São trinta e seis espécies que nós conhecemos aqui. Elas estão em risco de extinção por causa dos arrastões”, disse o cacique ao CIMI. Os arrastões são uma prática da pesca predatória em que grandes redes são arrastadas pelo fundo do rio, capturando todas as espécies que estiverem no caminho.

“Se nós perdermos esse lago, esses igarapés, nós perdemos nossa sobrevivência”.

Como parte da luta contra o agronegócio e a exploração do Lago do Maicá e dos igarapés da TI, Manoel participou da criação do Protocolo de Consulta dos Povos Indígenas Munduruku e Apiaká do Planalto Santareno, publicado em 2017.

O protocolo estabelece que os povos Munduruku e Apiaká devem ser consultados — e suas opiniões, respeitadas — sempre que surgir a possibilidade de implementação de projetos dentro da TI, como o porto no Lago do Maicá.

“Para nós, ajudou muito porque estamos vivendo um momento muito difícil, a questão dos portos, desse grande desmatamento. Esse papel foi muito válido, tem ajudado muito a nossa organização”, afirmou Manoel à organização Terra de Direitos em 2018, um ano após a criação do protocolo.

Lutando em defesa do território, pela união de seu povo e contra os grandes projetos de desenvolvimento na Amazônia, Manoel da Rocha Munduruku construiu uma história que lhe garante o título de guerreiro, assim como o que seu povo carrega.

Hoje, por conta das tensões de sua história de luta e resistência, Manoel está em Santarém, cuidando de sua saúde física e mental. Mas sua voz continua denunciando os abusos dos processos de expansão de monocultivos na Amazônia.

Tem momentos que a gente não sabe mais o que fazer, e a nossa luta, ela continua mais forte, mais árdua, e nós nunca vamos desistir do nosso território. Nós precisamos dele e é dele que nós sobrevivemos, nós precisamos da nossa floresta em pé.”

Pisar Suavemente na Terra

No documentário Pisar Suavemente na Terra, que estreia na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo em outubro, em data a ser divulgada, Manoel demonstra pesar pela destruição da floresta. Ao lado de Kátia Akrãtikatêjê, cacica do povo Akrãtikatêjê, de José Manuyama, indígena do povo Kukama no Peru, e do líder indígena Ailton Krenak, Manoel lamenta a exploração vivida por seu povo.

Um filme de Marcos Colón

Com as participações de:
Kátia Akrãtikatêjê, Manoel Munduruku, José Manuyama & Ailton Krenak
Roteiro: Marcos Colón & Bruno Malheiros
Fotografia: Bruno Erlan & Marcos Colón
Edição & trilha original: Diego Orix
Produção executiva: Erik Jennings & Marcos Colón
Direção e produção: Marcos Colón
Produção: Amazônia Latitude Films
Filmado no Brasil, Peru e Colômbia
Duração: 73 min | País: EUA/BRASIL | Ano: 2022 Estreia: Outubro de 2022

Instagram do documentário Pisar Suavemente na Terra.

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