Singularidade por uma mídia decolonial: a música afro-indígena do Amapá

Artigo reflete sobre a proliferação da singularidade da música afro-indígena do Amapá por uma perspectiva decolonial

Festa de Levantamento do Mastro em Curiaú. Foto: Gabriel Flores e Nayana Magalhães
Festa de Levantamento do Mastro em Curiaú. Foto: Gabriel Flores e Nayana Magalhães
Festa de Levantamento do Mastro em Curiaú. Foto: Gabriel Flores e Nayana Magalhães

Festa de Levantamento do Mastro em Curiaú. Foto: Gabriel Flores e Nayana Magalhães

RESUMO:

A música afro-indígena do Amapá é caracterizada por três estilos advindos de períodos e regiões diferentes da África: o Marabaixo, o Batuque, o Vominê, e do Çairé, uma dança de origem indígena incorporada pelos negros da Amazônia, estilos que conviveram por séculos numa prática mesclada dentro de festas religiosas, levando, assim, a uma influência simbiótica desses estilos entre si, mas sem perder a sua singularidade, mesmo dentro da mesma comunidade. Essa prática simbiótica nos leva a uma reflexão, de perspectiva decolonial, em que uma das formas de se manter uma cultura é a proliferação da mesma, ainda que seus padrões tradicionais venham a ser maculados. Considera-se que o conhecimento amplo de sua existência levará inevitavelmente a uma busca pelas suas raízes, trazendo de volta suas características culturais. Dessa busca emergem relações socio, político e econômicas praticadas por um determinado povo e suas comunidades.

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O Enxerido

Numa busca por respostas, ou pelo menos uma luz nos caminhos da, tão em voga, descolonização, aproveitei a viagem que fiz ao Amapá para dar início a uma pesquisa etnográfica tendo como informantes meus amigos músicos da região e adentrar os quilombos e comunidades preservadoras da cultura musical local, o Marabaixo, o Batuque, o Vominê e o Çairé. A fim de situar o/a leitor/a em relação aos aspectos técnicos desses quatro toques, as festas a eles associadas e seus respectivos vínculos históricos e culturais, apresentamos um breve resumo sobre cada um deles. Em seguida, passaremos ao relato da pesquisa de campo e às reflexões suscitadas pelas realidades encontradas.

A cultura do Marabaixo se estrutura na oralidade do canto dos ladrões, que são histórias cantadas por meio de melodias em escalas pentatônicas. Essas histórias geralmente são roubadas uns dos outros e incorporadas aos repertórios de cada um, daí o nome de Ladrão de Marabaixo. Esse fato nos lembra a famosa disputa pela autoria do primeiro samba gravado entre Donga e Sinhô que dizia: “Samba é que nem passarinho, é de quem pegar primeiro”. No presente trabalho, focaremos mais na singularidade do toque das caixas e suas características e influências1No artigo ‘Etnografia Global, uma análise prática do colonialismo reverso na cultura negra do Amapá através de uma mídia decolonial’, em elaboração, que complementa essa fase da pesquisa, desenvolveremos mais atentamente esse assunto..

Na concepção deste artigo, a opção por uma interação multimídia se faz da maior importância, visto que ao falarmos de sons devemos “lê-los” com os ouvidos. Também é possível apreciar imagens e outros materiais que ilustram este artigo clicando aqui.

O Marabaixo

É um toque que tem como característica principal a caixa, um tambor de tamanho variável com uma esteira de contas em sua pele inferior, sendo sua principal festa o Ciclo do Marabaixo, que tem início no Sábado de Aleluia e termina no Domingo do Senhor (primeiro domingo após Corpus Christi).

Caracterizado por uma estrutura rítmica de 1 compasso em 2/4, o padrão do toque de Marabaixo não se faz unificado entre os tocadores da caixa. Em cada comunidade, o toque tem sua identidade, e dentro de cada comunidade, existe a individualização desse toque numa singularidade2O conceito de singularidade se aplica, nesta pesquisa, ao modo individual característico de execução de padrões musicais socialmente compartilhados., uma maneira única de cada músico acentuar as notas do padrão ou mesmo de criar apojaturas que valorizam esses acentos, dando essa identidade peculiar individual3Neste artigo, a transcrição dos exemplos musicais seguirá um padrão que denominamos singularidade simplificada, escrevendo a rítmica dos acentos e não todas as semicolcheias, a fim de melhor destacar o padrão do toque da singularidade.. Essas diferenças podem ser constatadas nos exemplos abaixo, transcritos a partir de registros realizados nas comunidades do Curiaú (Ex. 1) e do Mazagão (Ex. 2).

Exemplo 1 – Marabaixo de rua do Curiaú (transcrição do autor). Crédito: Captura de tela do artigo "A Singularidade por uma Mídia Decolonial: A Música Afro-Indigena do Amapá, Suas Características Comunitárias e Interinfluências."

Exemplo 1 – Marabaixo de rua do Curiaú (transcrição do autor). Crédito: artigo “A Singularidade por uma Mídia Decolonial: A Música Afro-Indigena do Amapá, Suas Características Comunitárias e Interinfluências”

Exemplo 2 – Toque de Rua do Mazagão (transcrição do autor).Captura de tela do artigo "A Singularidade por uma Mídia Decolonial: A Música Afro-Indigena do Amapá, Suas Características Comunitárias e Interinfluências."

Exemplo 2 – Toque de rua do Mazagão (transcrição do autor). Crédito: artigo “A Singularidade por uma Mídia Decolonial: A Música Afro-Indigena do Amapá, Suas Características Comunitárias e Interinfluências”

Este toque é utilizado nos festejos no cortejo de rua. Quando os festivas são convidados a entrar nas casas, os caixeiros mudam para o Toque do Ladrão (Ex. 3 e Ex. 4).

Exemplo 3 – Marabaixo do Curiau (transcrição do autor)

Exemplo 3 – Marabaixo do Curiaú (transcrição do autor). Crédito: artigo “A Singularidade por uma Mídia Decolonial: A Música Afro-Indigena do Amapá, Suas Características Comunitárias e Interinfluências”

Exemplo 4 – Marabaixo do Mazagão (transcrição do autor)

Exemplo 4 – Marabaixo do Mazagão (transcrição do autor). Crédito: artigo “A Singularidade por uma Mídia Decolonial: A Música Afro-Indigena do Amapá, Suas Características Comunitárias e Interinfluências”

Conta-se pelos quilombos, que os negros escravizados, patriarcas desses que ali mantêm suas tradições, quando sequestrados, comercializados embarcados rumo ao norte do Brasil para a construção da Fortaleza de São José, no Amapá, em grande parte morriam pelos maus tratos recebidos no trajeto. Seus corpos eram atirados ao mar e flutuavam, até desaparecer “mar abaixo”. Assim surge uma cultura musical de um povo sofrido que aliviava sua dor em lamentos sonoros e veladas tristezas em danças rituais.

Hoje, ritmo recém tombado como patrimônio imaterial do Brasil, se perpetua, segundo o Iphan, com cinco grupos que mantêm a tradição do Marabaixo na zona urbana de Macapá (dois grupos no Laguinho e três na Favela, atual Santa Rita), além de 36 comunidades negras rurais em três municípios (Macapá, Santana e Mazagão) que praticam a dança do Marabaixo no interior do estado.

A Caixa do Marabaixo é um tambor de madeira feito de ripas ou esculpido do tronco oco de uma árvore, com tamanhos diferenciados, uns maiores e outros menores. Possui peles de cabra em ambos os lados, presas por aros, também de madeira, fixados por cordas de nylon como estirantes. De forma que possam ser apertados ou soltos para modificar a afinação. No lado inferior, é colocado um fio esticado com contas de plástico em contato com a pele inferior, que vibram ao toque, assim como a esteira das caixas claras das fanfarras, justificando seu nome de Caixa de Marabaixo, não tambor.

Neste vídeo, Mestre Pedro Bolão aparece afinando a Caixa de Marabaixo. Na sequência, Mestre Pedro4Mestre Pedro é irmão da D. Esmeraldina, e ambos são filhos da Tia Chiquinha, icônica perpetradora da cultura da música negra no Curiaú., construtor de tambor e líder do grupo Raízes do Bolão, morador do Quilombo do Curiaú, mostrará seu toque, bem como Adelson Preto e Paulinho Bastos.

O Batuque

O Batuque (Ex. 5) é tocado por dois tambores, o Amassador e o Dobrador, e por dois pandeirões, similares ao pandeiro do samba, com platinelas, mas bem maiores — sendo a Festa de São Joaquim, padroeiro do Quilombo do Curiaú, sua principal manifestação.

Exemplo 5 – Toque do Batuque (transcrição do autor)

Exemplo 5 – Toque do Batuque (transcrição do autor). Crédito: artigo “A Singularidade por uma Mídia Decolonial: A Música Afro-Indigena do Amapá, Suas Características Comunitárias e Interinfluências”

Ao contrário das Caixas de Marabaixo, cujas peles são presas por estirantes que possibilitam alterar a afinação, os instrumentos do batuque têm as peles fixas, necessitando aquecê-las para subir a afinação. O aquecimento das peles na fogueira é um ritual de grande beleza visual e espiritualidade.

O Vominê

O Vominê usa a mesma Caixa do Marabaixo, de madeira, mas antigamente se usava uma caixa de metal como as caixas militares, semelhante à caixa clara com esteira.

O tambor é um instrumento assaz comum nos ritmos brasileiros. Porém, a Caixa do Marabaixo ou do Vominê é um tambor provido de uma esteira de sementes ou contas na pele inferior, que vibram simulando a sonoridade do toque militar, provavelmente imitando as caixas dos militares portugueses no período da construção da Fortaleza de São José5Iphan. Dossiê do Marabaixo. Macapá, 2013a. p. 353. Disponível apenas em meio digital..

No Vominê, que representa a batalha entre cristãos e mouros, o toque é mais militar e sua festa acontece na alvorada de 24 de julho como Festa de São Tiago, acompanhada pelo Baile de Máscaras. Realizado desde 1777, na vila de Mazagão Velho, o evento consiste na encenação de um espetáculo de fé, que conta a história do guerreiro Tiago, soldado que lutou ao lado do povo de Cristo, ajudando a vencer as grandes batalhas contra os mouros. Uma das tradições da Festa de São Tiago é a chamada Dança do Vominê nas casas dos festeiros6Conheci o Mestre Josué Videira em sua casa, em Mazagão Velho, onde nos recebeu, eu e Paulinho Bastos, para algumas horas de conversa e gravações que constam neste artigo.. Abaixo (Ex. 6 e Ex. 7), as transcrições dos toques da Alvorada e da Dança do Vominê.

Exemplo 6 – Toque da Alvorada, Vominê (transcrição do autor)

Exemplo 6 – Toque da Alvorada, Vominê (transcrição do autor). Crédito: artigo “A Singularidade por uma Mídia Decolonial: A Música Afro-Indigena do Amapá, Suas Características Comunitárias e Interinfluências”

Exemplo 7 – Toque do Dança, Vominê (transcrição do autor)

Exemplo 7 – Toque do Dança, Vominê (transcrição do autor). Crédito: artigo “A Singularidade por uma Mídia Decolonial: A Música Afro-Indigena do Amapá, Suas Características Comunitárias e Interinfluências”

Çairé ou Sairé

O Çairé é tocado num pequeno tambor, similar ao do Marabaixo. Tradicionalmente, com uma única baqueta, deixando o outro braço livre para danças e coreografias. Porém, no Carvão, e mesmo no Mazagão, se utilizam as duas baquetas, devido à incorporação do Toque do Marabaixo.

Exemplo 8 - Toque do Çairé

Exemplo 8 – Toque do Çairé. Crédito: artigo “A Singularidade por uma Mídia Decolonial: A Música Afro-Indigena do Amapá, Suas Características Comunitárias e Interinfluências”

Como no frevo de Pernambuco, a sincopa é usada como divisor de períodos musicais de 8 ou 16 compassos, também conhecido como fill (preparação ou preenchimento) na escrita para bateria e percussão na música popular:

Exemplo 9 – Toque da sincopa (transcrições do autor)

Exemplo 9 – Toque da Sincopa (transcrições do autor). Crédito: artigo “A Singularidade por uma Mídia Decolonial: A Música Afro-Indigena do Amapá, Suas Características Comunitárias e Interinfluências”

Festa do Sairé ou Çairé é uma festividade de caráter religioso introduzido nas missões religiosas da Amazônia pelos jesuítas, no século XVII. O primeiro Çairé de que se tem notícia foi organizado pelo Padre João Maria Gorzoni na aldeia dos Tapajós. Posteriormente, foi levado para outras missões.

Por outro lado, a palavra Çairé é derivada de Çai Erê, que significa “Salve! Tu o dizes”, que era usada pelos indígenas como forma de saudação.

Nesses quatro séculos, os caminhos do Çairé foram muitos7“O Sairé é uma dança do índio que o negro aprimorou”. Foi assim que ouvi uma quilombola do Carvão dizer durante o Ciclo do Marabaixo de 2017. O Sairé paraense provavelmente tem origem ameríndia, com alguma influência africana proveniente de ritmos como o Marabaixo., e atualmente ocorre em períodos diferentes, sendo a mais conhecida em Alter do Chão, em julho, e no Amapá, em dezembro, próximo ao Natal, na comunidade do Carvão, em Mazagão Velho8“O Sairé é uma dança indígena introduzida na Festa de São Tomé por Dona Clara Lemos, esposa de Raimundo da Silveira Belo, que em 1915 fez a primeira novena que se transformou na festa.”, como conta mestre Josué.

A Festa de São Tomé, no distrito do Carvão, como no Vominê, começa na alvorada, mas de16 a 23 de dezembro. Em Mazagão, o santo homenageado é São Tiago, e ambas as festas têm uma estrutura similar, com cortejos de rua, ladainhas em igrejas e danças em locais fechados. As ladainhas da Festa de São Tiago de Mazagão Velho e São Tomé no Carvão são cantadas até os dias de hoje em latim9Kyrie eleison Chrite eleison Christe Audi nos, Christe exaudi nos Pater collis Deus Miserere nobis Fili redentor, munde Deus Spirito sancto Deus Sancta trinitasis unos Deus Santa Maria Ora pro nobis Sancta de Genitrix Sancta virgo virgenum Mater christe Mater Divinae gratiae Mater Puríssima – PINHEIRO, Angleson Pantoja. “A cultura de Mazagão Velho e a Festa de São Tiago das crianças são joias raras”: a construção da identidade cultural mazaganense a partir da festa de São Tiago Mirim, Mazagão Velho. AP. Dissertação (Mestrado) – Programa de Pós-Graduação em Educação. Universidade Federal do Amapá, Macapá, 2023..

Transcrevi os toques relativos a cada momento da festividade no Distrito do Carvão10Os vídeos da comunidade do Carvão foram retirados do documentário de Iran de Souza e AAFCP Associação Amapaense de Cultura (Ex. 10 a 13):

Exemplo 10 - Toque Cortejo 1 Festa de São Tiago (transcrição do autor)

Exemplo 10 – Toque Cortejo 1, na Festa de São Tiago (transcrição do autor). Crédito: artigo “A Singularidade por uma Mídia Decolonial: A Música Afro-Indigena do Amapá, Suas Características Comunitárias e Interinfluências”

Exemplo 11 - Toque Cortejo 1 e Toque Cortejo 2, na Festa de São Tiago (transcrição do autor)

Exemplo 11 – Toque Cortejo 1 e Toque Cortejo 2, na Festa de São Tiago (transcrição do autor). Crédito: artigo “A Singularidade por uma Mídia Decolonial: A Música Afro-Indigena do Amapá, Suas Características Comunitárias e Interinfluências”

Exemplo 12 - Toque da Dança 1 Festa de São Tiago (transcrição do autor)

Exemplo 12 – Toque da Dança 1, na Festa de São Tiago (transcrição do autor). Crédito: artigo “A Singularidade por uma Mídia Decolonial: A Música Afro-Indigena do Amapá, Suas Características Comunitárias e Interinfluências”

Exemplo 13 - Toque da Dança 1 Festa de São Tiago e Toque da Dança 2, na Festa de São Tiago (transcrição do autor)

Exemplo 13 – Toque da Dança 1, na Festa de São Tiago, e Toque da Dança 2, na Festa de São Tiago (transcrição do autor). Crédito: artigo “A Singularidade por uma Mídia Decolonial: A Música Afro-Indigena do Amapá, Suas Características Comunitárias e Interinfluências”

Exemplo 14 - Toque da caixa de Marabaixo do Carvão (transcrição do autor)

Exemplo 14 – Toque da Caixa de Marabaixo do Carvão (transcrição do autor). Crédito: artigo “A Singularidade por uma Mídia Decolonial: A Música Afro-Indigena do Amapá, Suas Características Comunitárias e Interinfluências”

Exemplo 15 - Toque do Pau de chuva do Carvão (transcrição do autor)

Exemplo 15 – Toque do Pau de Chuva do Carvão (transcrição do autor). Crédito: artigo “A Singularidade por uma Mídia Decolonial: A Música Afro-Indigena do Amapá, Suas Características Comunitárias e Interinfluências”

Sempre me questionei do porquê das diferenças rítmicas entre o Brasil e os outros países da América espanhola e Caribe, onde a presença da rítmica do 3 contra 2 é uma constante, enquanto nossos ritmos mais frequentes são sempre relacionados ao binário simples. Em algumas singularidades do Marabaixo, percebo uma certa tendência à tercina, como podemos ver nos exemplos que seguem (Ex. 16 e Ex. 17):

Exemplo 16 - Singularidade Mestre Adelson (transcrição do autor)

Exemplo 16 – Singularidade Mestre Adelson (transcrição do autor). Crédito: artigo “A Singularidade por uma Mídia Decolonial: A Música Afro-Indigena do Amapá, Suas Características Comunitárias e Interinfluências”

Nessa singularidade do Mestre Adelson Preto, a tercina acaba sendo sugerida em função das apojaturas resultando num ouvir similar a:

Exemplo 17 – Tercinamento da singularidade (transcrição do autor)

Exemplo 17 – Tercinamento da singularidade (transcrição do autor). Crédito: artigo “A Singularidade por uma Mídia Decolonial: A Música Afro-Indigena do Amapá, Suas Características Comunitárias e Interinfluências”

Na discussão de Carlos Sandroni sobre o paradigma ao tresillo, podemos deixar aqui uma proposição em aberto que seria as figuras acima diferenciadas simplesmente por uma questão de singularidade, e que duas singularidades (uma espaçada e livre e outra mais acentuada) criam um natural 3 contra 2.

Entretanto, encontrei no Distrito do Carvão um Batuque em 3 que acompanha a procissão do Andor. Não temos uma figura aqui do 3 contra 2, mas temos a transformação do Toque do Batuque de semicolcheias para tercina com uma variação do andamento para menos. Ou seja, de dança para procissão (Ex. 18 e Ex. 19).

Procissão do Andor – Amassador.

Procissão do Andor - Amassador

Exemplo 18 – Toque da Procissão do Andor, Carvão (transcrição do autor). Crédito: artigo “A Singularidade por uma Mídia Decolonial: A Música Afro-Indigena do Amapá, Suas Características Comunitárias e Interinfluências”

Pau de chuva

Exemplo 19 - Toque Procissão do Andor Carvão (transcrição do autor)

Exemplo 19 – Toque Procissão do Andor Carvão (transcrição do autor). Crédito: artigo “A Singularidade por uma Mídia Decolonial: A Música Afro-Indigena do Amapá, Suas Características Comunitárias e Interinfluências”

Singularidade e Simbiose: uma breve digressão sobre instrumentos enquanto totens

Na viagem, deparei-me com uma realidade etnográfica diversa da que esperava, dando assim um encaminhamento mais amplo a essa pesquisa, na qual a questão da singularidade do toque passa a ser um fator de menor envergadura, já que questões de identidade englobam diversas culturas externas, que mais adentram e influenciam o universo dos quilombos e das comunidades do que por elas são influenciadas.

Posso exemplificar esse conceito por meio do Maracatu de Pernambuco, internacionalizado por Chico Science & Nação Zumbi, cujo resultado é a emergência de grupos de maracatu espalhados por diversos lugares, dentro e fora do Brasil, praticando o Maracatu tradicional, de Pernambuco.

O Maracatu teve uma enorme disseminação pelas mãos de Moacir Santos, Maracatucutê e Maracatu Nação do Amor (April Child); de Egberto Gismonti, Maracatu (LP Alma, 1986); de Hermeto Pascoal, em várias músicas, sendo que esses dois últimos tiveram como baterista o músico Nenê, Realcino Lima, que criou uma bateria brasileira, distribuindo padrões rítmicos brasileiros mesclados numa única levada, talvez o mais importante desenvolvimento do instrumento depois do samba no prato de Edison Machado11O baterista Edison Machado é reconhecido como dono de um estilo personalíssimo, que muitos até hoje chamam de “samba no prato”. Reza a lenda que isso aconteceu em 1949, quando ele furou a pele da caixa durante um baile e acabou tocando a noite toda usando apenas os pratos e o restante dos tambores.. No meu álbum Rumo Norte, de 1999, tem o choro-maracatu Espírito da Coisa, e no recente Sextando, o maracatu em ¾ Supernova composto em 2002, afirmando as tendências dessa expansão estilística.

Podemos inclusive traçar paralelos entre o Maracatu e os ritmos da Amazônia, como a utilização da clave do gonguê, o acento na 2ª semicolcheia no segundo tempo do Marabaixo e a própria nominação da escola de samba da Favela — Grêmio Recreativo Escola de Samba Maracatu da Favela — que teve seu início em 1947, demonstrando essa simbiose rítmica do Marabaixo com o Samba e o Maracatu.

Gonguê (agogô)

Gonguê (agogô)

Exemplo 20 – Toque Maracatu do Baque Virado (transcrição do autor). Crédito: artigo “A Singularidade por uma Mídia Decolonial: A Música Afro-Indigena do Amapá, Suas Características Comunitárias e Interinfluências”

Alfaia e Xequerê

Alfaia e Xequerê

Exemplo 21 – Toque Maracatu do Baque Virado (transcrição do autor). Crédito: artigo “A Singularidade por uma Mídia Decolonial: A Música Afro-Indigena do Amapá, Suas Características Comunitárias e Interinfluências”

Xequerê

Exemplo 22 - Toque Maracatu do Baque Virado (transcrição do autor)

Exemplo 22 – Toque Maracatu do Baque Virado (transcrição do autor). Crédito: artigo “A Singularidade por uma Mídia Decolonial: A Música Afro-Indigena do Amapá, Suas Características Comunitárias e Interinfluências”

Como podemos observar, os instrumentos do Maracatu estão à venda tanto em lojas físicas quanto pela internet, por todo o mundo, algo que não vemos com o Marabaixo, o Batuque, o Vominê e o Çairé. O processo de “colonialismo reverso” se faz também por meio do mercado, comercializando o “instrumento-totem”12Cunhamos este conceito para ilustrar uma certa relação totêmica do instrumento enquanto artefato cultural. O instrumento totem é aquele que traz em si toda uma cultura que nos questionamos: quem toca quem, o instrumentista o instrumento ou o instrumento o instrumentista? que por si só perpetua a cultura. Ou seja, a simbiose entre o moderno e o tradicional gera não apenas uma renovação do moderno, mas uma amplificação das culturas tradicionais e um maior interesse em conhecê-las e praticá-las.

Por outro lado, o desenvolvimento de materiais didáticos e pedagógicos como partituras, publicações, playbacks, métodos, entre outros, acabam mantendo a oralidade como uma extensão, mesmo que seu meio de transmissão seja impresso ou digital.

É importante notar que, se temos como referência as escolas europeias e norte-americanas, é pelo fato de o registro de sua cultura ser disposto como produto de exportação, cultura embalada e disponibilizada por todos os meios de mídia possíveis. Sigamos seu exemplo!

Mestre Pedro Bolão (construtor de Caixas de Marabaixo)

No vídeo com a narrativa do Mestre Pedro Bolão, tiramos três fatos interessantes:

  1. A Casa do Artesão não representa a comunidade, sendo mais um factoide político-turístico, e não um verdadeiro centro cooperado gerido pelos artesãos. Isso se distancia em muito da prática do Quilombo, onde uma terra é destinada pela associação gerida pelos próprios quilombolas a quem chegar e comprovar a descendência quilombola;
  2. A influência do empreendedorismo e da economia global, possíveis pela tecnologia digital e as redes sociais;
  3. O fato de se levar a cultura do Marabaixo por meio de um ícone da cultura, a Caixa, ou qualquer outro instrumento-totem vinculado ao rito cultural.

O Colonialismo Reverso13Esse conceito explora reverso, assim como no dito popular do “reverso da moeda”, sua contrapartida, uma reação ao colonialismo europeu, numa analogia simples de que como a moeda a cultura tem duas faces, e agora está mais do que na hora de mostrarmos a nossa para o mundo.

Poderemos afirmar na prática o “colonialismo reverso” dentro das comunidades negras de Macapá e Mazagão, que distam uns 40 km por estrada ou pelo rio Amazonas com acesso pelo furo de Mazagão. Essa simbiose pode ser apreciada quando expomos os cruzamentos de toques que resultam em um novo toque ou numa singularidade regional.

O “colonialismo reverso” é um tipo de simbiose no qual a inclusão da cultura ancestral se faz dentro de outras culturas estético-musicais. Ao tocar o samba com uma condução no prato, como fazia Edison Machado, temos algo como uma citação, mas ao tocarmos jazz em ritmo de samba, temos uma apropriação cultural de uma estética impondo outra cultura sobre ela. Seria, assim, o “colonialismo reverso”, uma forma mais eficiente de decolonização, como explica Paulinho Bastos, ao usar dessa prática colocando o Marabaixo como base rítmica em outras estéticas:

[…] Daqui [do Curiaú], nós montamos o Nave Negreiros, o Afro Brasil, que já estava montado e o Adelson [Preto] me convidou. […] O Nave Negreiros nós tocávamos música universal com Caixa de Marabaixo. […] Universal são os hits [e toca exemplos]. […] A intenção era colocar esses células [do Marabaixo], era o trabalho que a gente fazia para a formação de público para esse ritmo. […] A gente fazia forró em forma de Marabaixo, a gente fazia muitas outras coisas utilizando o Marabaixo e o batuque, lambada [e toca]. […] O pessoal dizia: ‘cara, mas que legal!’ A ideia era mostrar para o público que a nossa música também pode ser uma referência.

Esse seria um exemplo de “colonialismo reverso”, o reverso da moeda dentro da grande mídia musical, a qual, por meio das estruturas imperialistas do mercado, determina o que deve ser tocado e ouvido, ditando, assim, a cultura global.

As Singularidades do Marabaixo

Curiaú, Laguinho, Favela e Mazagão

Percebi que, em relação às singularidades no toque da Caixa do Marabaixo, tem-se uma clara divisão de dois padrões básicos: o que é o praticado no Curiaú (Ex. 23) e o que é praticado em Mazagão (Ex. 24).

Exemplos 23 e 24

Crédito: artigo “A Singularidade por uma Mídia Decolonial: A Música Afro-Indigena do Amapá, Suas Características Comunitárias e Interinfluências”

Em torno de 1764, iniciaram-se as obras da Fortaleza de São José, iniciando também a colonização de Macapá e seu reduto negro, a Favela, no entorno do forte. O Laguinho foi um êxodo imposto pelo governo em 1946 para “limpar” o centro da cidade. Já o Curiaú foi o local onde negros fugidos da construção da fortaleza se refugiaram, próximo a rio Curiaú, formando o quilombo. Isso deixa claro a ligação entre as populações das três comunidades, cujos membros decerto são todos aparentados.

Com isso, podemos perceber que a singularidade entre essas três comunidades são as mesmas que encontramos dentro de cada uma delas: a simples forma individual de tocar o mesmo padrão rítmico com um jeito próprio, com a cultura formativa que a vida lhe deu, com o que ouve, lê, assiste, conversa, viaja. Em suma, seu próprio e único aprendizado de vida refletido num Toque de 1 compasso binário.

O Mazagão foi criado em torno de 1770, com moradores da Mazagão africana, no Marrocos, trazidos pelos portugueses devido à invasão moura. Sua manifestação mais forte é o Vominê, em que o toque da Caixa é bem mais marcial, mais europeu. Assim, podemos inferir que a introdução do Marabaixo em Mazagão se fez por influência negra do Macapá.

Por outro lado, a ocorrência no festejo do Ciclo do Marabaixo, com a prática do Toque do Marabaixo de rua tocando pelo cortejo, ao adentrar as casas receptivas aos marabaixistas, é mudado para o Toque do Ladrão de Marabaixo. Essa prática em muito se parece com a prática do Vominê, na qual o toque de rua (toque da alvorada, muito similar ao Marabaixo de rua) precede a entrada nas casas receptivas aos “caixeiros”, onde passa a ser tocado o Toque da Dança.

Pude observar então algumas variações nesses toques, as quais chamaremos de singularidades.

No Curiaú

Importante observar que os toques são contínuos. O compasso de 2 tempos apresentado em dois grupos de 4 semicolcheias, invertemos as mãos, sendo que é a acentuação das semicolcheias que cria a singularidade.

Passo a transcrever a singularidade de quatro mestres do Marabaixo (todos com vídeo):

Mestre Pedro Bolão (Curiaú)

Toque 1 – O começo do toque, em anacruse, define a singularidade:

Ex, 25 Toque1 Mestre Pedro (transcrição do autor)

Exemplo 25 – Toque 1 Mestre Pedro (transcrição do autor). Crédito: artigo “A Singularidade por uma Mídia Decolonial: A Música Afro-Indigena do Amapá, Suas Características Comunitárias e Interinfluências”

Ex, 26 Toque 2 Mestre Pedro (transcrição do autor)

Exemplo 26 – Toque 2 Mestre Pedro (transcrição do autor). Crédito: artigo “A Singularidade por uma Mídia Decolonial: A Música Afro-Indigena do Amapá, Suas Características Comunitárias e Interinfluências”

Mestre Adelson Preto (Curiaú)

Toque 1 Uso de apojaturas

Ex, 27 Toque1 Mestre Adelson (transcrição do autor)

Exemplo 27 – Toque 1 Mestre Adelson (transcrição do autor). Crédito: artigo “A Singularidade por uma Mídia Decolonial: A Música Afro-Indigena do Amapá, Suas Características Comunitárias e Interinfluências”

Ex, 28 Toque2 Mestre Adelson (transcrição do autor)

Exemplo 28 – Toque 2 Mestre Adelson (transcrição do autor). Crédito: artigo “A Singularidade por uma Mídia Decolonial: A Música Afro-Indigena do Amapá, Suas Características Comunitárias e Interinfluências”

Mestre Paulinho Bastos (Laguinho)

Leveza e acentuação na 4ª e na 6ª semicolcheias do grupo de 8 do compasso binário.

Ex, 29 Toque1 Mestre Paulinho (transcrição do autor)

Exemplo 29 – Toque 1[mfn]Toque 2 com fortes acentos no 2 e 5[/mfn] Mestre Paulinho (transcrição do autor). Crédito: artigo “A Singularidade por uma Mídia Decolonial: A Música Afro-Indigena do Amapá, Suas Características Comunitárias e Interinfluências”

Ex, 30 Toque2 Mestre Paulinho (transcrição do autor)

Exemplo 30 – Toque 2 Mestre Paulinho (transcrição do autor). Crédito: artigo “A Singularidade por uma Mídia Decolonial: A Música Afro-Indigena do Amapá, Suas Características Comunitárias e Interinfluências”

Ex, 31 Toque3 Mestre Paulinho – acento na 6ª semicolcheia (transcrição do autor)

Exemplo 31 – Toque 3 Mestre Paulinho – acento na 6ª semicolcheia (transcrição do autor). Crédito: artigo “A Singularidade por uma Mídia Decolonial: A Música Afro-Indigena do Amapá, Suas Características Comunitárias e Interinfluências”

Curiaú – naipe de caixas

Neste vídeo, vemos os três mestres tocando juntos, e podemos perceber que, como numa orquestra, o toque do naipe se homogeneíza, sempre em função do líder do naipe, neste caso, o Mestre Pedro.

Mestre Josué Videira (Mazagão Velho)

No Mazagão, o toque de rua acentua a 5ª semicolcheia de 6 (sextina), e a dança começa com repetição da mão direita, o que leva o acento para as colcheias:

De Rua

Ex, 32 Toque1 Marabaixo de Rua Mestre Josué (transcrição do autor)

Exemplo 32 – Toque 1 Marabaixo de Rua Mestre Josué (transcrição do autor). Crédito: artigo “A Singularidade por uma Mídia Decolonial: A Música Afro-Indigena do Amapá, Suas Características Comunitárias e Interinfluências”

Do Ladrão

Ex, 33 Toque 2 do Ladrão Mestre Josué (transcrição do autor)

Exemplo 33 – Toque 2 do Ladrão Mestre Josué (transcrição do autor). Crédito: artigo “A Singularidade por uma Mídia Decolonial: A Música Afro-Indigena do Amapá, Suas Características Comunitárias e Interinfluências”

Doze singularidades do Toque de Marabaixo simplificadas14O toque simplificado é o qual, na escrita, só constam as notas que são acentuadas, deixando-se de lado as ghost notes, já que o toque, em geral, é sempre em semicolcheias contínuas.

Ao se ouvir os marabaixeiros por um tempo prolongado, podemos perceber as sutis variações nas acentuações, criando, assim, diversidade de singularidades nos toques dos da caixa.

Transcrevo alguns toques que me soaram mais constantes:

Exemplos do 34 ao 37

Crédito: artigo “A Singularidade por uma Mídia Decolonial: A Música Afro-Indigena do Amapá, Suas Características Comunitárias e Interinfluências”

Exemplos do 38 ao 41

Crédito: artigo “A Singularidade por uma Mídia Decolonial: A Música Afro-Indigena do Amapá, Suas Características Comunitárias e Interinfluências”

Exemplos do 42 ao 45

Crédito: artigo “A Singularidade por uma Mídia Decolonial: A Música Afro-Indigena do Amapá, Suas Características Comunitárias e Interinfluências”

Considerações

A exposição sobre os Toques do Marabaixo, suas singularidades locais e individuais, conduzem, ao cabo, ao conceito do “colonialismo reverso”, uma prática de expansão cultural por meio da infiltração tanto da cultura musical quanto das práticas a ela relacionadas, desde uma festividade, até seus símbolos, em outras práticas. Poder-se-ia questionar se essa ação não seria de natureza colonialista, mas acreditamos que a simbiose não seja uma prática invasiva, e sim de miscigenação cultural, uma forma de trocar saberes.

Na América Latina e, em particular, no Brasil, vivemos como num grande laboratório de cruzamento de raças, fato que vem nos dando uma identidade única e riquíssima, principalmente no campo das artes. Consideramos, portanto, o “colonialismo reverso” a forma mais eficiente na miscigenação cultural, como na filosofia surrealista, na qual se faz necessário a existência de um preconceito estético, uma convenção ou um condicionamento cultural para que ele possa ser posto em questionamento, como a imagem de um navio ancorado nas nuvens, que é composto somente por imagens conhecidas, mas dispostas de forma inusitada, assim é como tocar choro com ritmo de Marabaixo, Tango, Baião, Rock, etc.

Interessante pensar também no processo colonialista por meio da apropriação da riqueza material (mineral, biológica), imaterial (cultural) e humana dos países “colonizados”, onde essa matéria bruta é extraída e processada pelos países ricos e vendida de volta como produto acabado, agregando a ele a mais valia dessa economia colonizadora. Temos como exemplo recente no Brasil o desmanche nas refinarias, exportando o petróleo bruto e o comprando de volta beneficiado, atrasando nosso desenvolvimento industrial.

Na música, podemos dar alguns exemplos de apropriações que se transformaram em mercadoria global, como os ritmos e sonoridades do Oriente Médio, em Caravan (Duke Ellington) ou Night in Tunisia (Dizzy Gillespie), no final dos anos 1930 começo dos 1940, o samba levado por Carmen Miranda para Hollywood, os ritmos do Caribe levados por Xavier Coogar e Tito Puentes, a Bossa Nova no Carnegie Hall, entre centenas outras matérias-primas que passam a ser uma grande fonte de renda, além de um processo de manutenção da colonização por meio de uma espécie de agregamento etnocultural, uma ideia de pertencimento ao império, na verdade, porém, mantendo-se explorados pelo Grande Irmão previsto por George Orwell.

O “colonialismo reverso” não está ancorado nessas práticas, e sim na simples miscigenação cultural. No entanto, propõe uma discussão para a criação de espaços que possam alimentar a criação de cooperativas culturais, tanto para produtos como para serviços.

De certo, temos uma arte fruto de uma miscigenação interna de grande diversidade e alta aceitação mundial, mas vivendo de forma latente, aguardado as exploradoras mãos dos colonizadores. Fica claro que precisamos de instituições públicas que norteiem a divulgação mundial de nossa cultura, uma espécie de Instituto Goethe ou Camões, um tipo de instituição pública que aqui fosse atrelado ao MinC em parceria com o Itamaraty, um Instituto Pau Brasil e uma Tupiwood (Hollywood tupiniquim).

Em 2022, escrevi o artigo Semana de 22, 100 Anos de um Ontem Hoje para a revista Ocas, no qual escrevo:

Ainda temos uma excelência pregada pelas instituições, assim como na Semana de 22, moldes importados, fazemos orquestras europeias com dinheiro público, importando mestres divinos como se esta verdade fosse absoluta. Destruímos as manifestações locais, por não praticar o conceito “cultura bactéria”, manter o meio para existir. Achamos bonito o que vem de fora, nos ditos das roupas, nos nomes das lojas, dos filhos, dos pets, amamos a cultura importada, posta por um Hollywood way of life. Como sair desse colonialismo eterno?

Apesar do limitado alcance da minha ação individual, valendo-me da internet e de seu potencial disruptivo, procurei contribuir com este projeto identitário nacional por meio do Movimento sem Tela, cuja proposta está expressa em forma de manifesto: “Se a arte não transgride, não é arte, é decoração!”, e clama em altos brados, “Nossa arte é brasileira!”

Referências

Paulo Eduardo Flores da Silva é bacharel em Artes, Flauta Transversal, Composição e Regência (1981) pelas Faculdades de Artes Alcântara Machado (Faam-FMU). Músico, artista plástico e escritor, criou trilhas, jingles e vinhetas para rádio, TV, vídeo e cinema. Suas composições já foram premiadas em vários festivais dentro e fora do país. Docente do Conservatório de Tatuí desde 1981, onde foi co-criador do Departamento de Música Popular Brasileira e Jazz, e do Festival Brasil Instrumental. Criador da premiada ONG Brasil Cultural em 2009, para ações sociais no campo das artes. Escritor e artista plástico, possui obra em acervo permanente no MAC de Pernambuco. Atualmente, é pós-graduando no PPGMUS da Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc).

Guilherme Sauerbronn de Barros é bacharel em Piano pela Unirio (1994), mestre em Música – Piano pela UFRJ (1998) e doutor em Musicologia pela Unirio (2005). É professor titular na Udesc e vice-coordenador do PPGMUS/Udesc, onde orienta trabalhos de mestrado e doutorado e coordena projetos de pesquisa. Tem vasta experiência como camerista e desenvolve pesquisa nas áreas de análise musical, epistemologia e interpretação musical. É membro do corpo editorial da revista Debates (Unirio), editor convidado do Art Reseach Journal e editor permanente da revista Orfeu, do PPGMUS-Udesc. É membro da diretoria da Associação Brasileira de Teoria e Análise Musical (TeMA) desde 2018, onde atualmente ocupa o cargo de Vice-Presidente.

Edição: Alice Palmeira
Revisão: Isabella Galante
Arte: Fabrício Vinhas
Direção: Marcos Colón

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